“O homem do cavaquinho” revela as rotas esquecidas do instrumento na Indonésia

Jacarta, 08 nov (Lusa) – “O homem do cavaquinho” é o novo documentário que o realizador Ivan Dias está a preparar para revelar as rotas do instrumento português na Indonésia e do popular “fado indonésio”.

A realização deste documentário surge na senda de um sonho antigo de Ivan Dias de “procurar as histórias do cavaquinho”, instrumento que nasceu em Braga, a sua cidade natal, e de contá-las ao grande público.

Depois da série “Apanhei-te cavaquinho”, que conta a viagem do instrumento pelo mundo, designadamente Portugal, Brasil, Cabo Verde, Los Angeles e Havaí, o produtor decidiu seguir as informações “muito subtis” sobre algo que “parecia ser uma coisa antiga que se tinha perdido” na Indonésia.

“Há uma desinformação brutal sobre a Indonésia, tanto por culpa dos holandeses durante 200 anos, como por culpa da ditadura do Suharto”, justificou.

Os portugueses foram os primeiros europeus a chegar à Indonésia, em busca de especiarias, o ‘ouro’ do século XVI, e procurando espalhar o catolicismo, mas a subsequente colonização holandesa tentou apagar todas as marcas portuguesas ali deixadas.

O documentário marca também o regresso do compositor e multi-instrumentista Júlio Pereira ao universo do cavaquinho, instrumento que, há mais de 30 anos, levou ao seu reconhecimento nacional e internacional.

Segundo o realizador, “há quatro anos, o Júlio Pereira não queria voltar a pegar no cavaquinho”, mas durante uma viagem de comboio em que tentava convencê-lo a tal, o revisor reconheceu-o como “o homem do cavaquinho” e foi aí que o músico decidiu render-se e embarcar no projeto.

Desde então, além do documentário, Júlio Pereira reinventou o instrumento, gravando o disco “Cavaquinho.pt” e iniciando a Associação Cultural Museu Cavaquinho, à qual preside.

Durante uma viagem de duas semanas, os dois, juntamente com o diretor de fotografia Carlos Mendes Pereira, viram as suas expectativas superadas ao descobrirem que o keroncong – nome dado ao cavaquinho local e também ao estilo com influências do fado – “é talvez o único género musical que une todo o arquipélago da Indonésia”.

“O keroncong vem diretamente de uma raiz cultural portuguesa que se foi transformando de Lisboa para Cabo Verde, de Cabo Verde para Goa, de Goa para Malaca e de Malaca para Java e para a Banda Neira”, explicou.

Ivan Dias sublinhou que o keroncong “tem de facto uma ligação umbilical especial com Portugal pelos instrumentos”, sendo que os indonésios “dividiram o cavaquinho em dois”, e pela temática, com “canções romanescas” e “de saudade”.

A película “é realmente fruto do amor de muito gente”, porque a RTP suportou dois terços do orçamento, com “20 mil euros”, e “muita gente envolvida no projeto abdicou de qualquer tipo de ganho”, frisou.

“A RTP vive sempre dias complicados quando é para apoiar estas coisas mais importantes da cultura. Gastam mais dinheiro noutras coisas”, lamentou o bracarense.

O trabalho deverá estar finalizado em dezembro, mas ainda não há uma data prevista para a sua exibição na televisão pública, sendo que Ivan Dias deseja também oferecê-lo à Indonésia para que a verdade sobre a origem do keroncong se mantenha viva do outro lado do mundo.

Ivan Dias comprometeu-se também a tentar levar a Portugal o famoso grupo musical indonésio Keroncong Tugu, por considerar que “é o mínimo que Portugal pode fazer por uma comunidade que mantém desde 1661 uma relação umbilical” com o país.

A comunidade dos ‘tugu’ ou dos ‘portugueses negros’ terá nascido do cruzamento de escravos de portugueses na Índia, que foram levados para Jacarta, com comerciantes, artesãos e aventureiros oriundos de Malaca, Ceilão, Cochim e Calecute.

Entretanto, o produtor reuniu-se com a vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Lisboa, Catarina Vaz Pinto, que se mostrou disponível para apoiar a realização do sonho do grupo de ir a Portugal.

Ivan Dias conta com várias produções relacionadas com a música, como “Carlos do Carmo: Um homem no mundo”, “A revolução de abril – No olhar de Carlos Gil”, “Povo que canta”, “Fados” e “Guitarras à portuguesa”.

AYN // VM – Lusa/Fim

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