Falecimento do Professor Fernando J. B. Martinho (1937-2025)
11 de Abril, 2025
Fernando Martinho licenciou-se em Filologia Germânica (e deu explicações de língua alemã, recordadas por António Martinó: «Spreche Sie langsamer, bitte! Ich verstehe nicht»), foi Leitor em Bristol e em Santa Barbara, Califórnia, mas o seu percurso profissional acha-se sobretudo marcado por actividade docente na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa de 1982 até à aposentação. Foi, nomeadamente, professor de Teoria da Literatura, na década de 80, em aulas que articulavam, em duas partes separadas por intervalo gentil para os alunos, a explicação de conceitos com o estudo de textos literários. Na década de 90, foi professor e coordenador da disciplina de Introdução aos Estudos Literários. Entre outras formas de reconhecimento, foi galardoado com o Prémio Pen Clube Português de Ensaio, em 1996; com o tributo de Consagração da Fundação Inês de Castro, em 2016, e com o prémio Jacinto do Prado Coelho de Ensaio, 2022.Era detentor de um invulgar conhecimento cumulativo da poesia portuguesa do séc. XX, muito proveniente da sua prática enquanto crítico literário de publicação frequente em jornais como O Comércio do Porto e em revistas como a Colóquio-Letras. Cultivava uma escrita de disposição afável e de gosto largo, o que levou muitas casas editoras e autores bem diferentes a contarem com ele para um género difícil, o da apresentação. Devem-se-lhe prefácios a escritores tão diversos quanto Eugénio de Andrade, António Ramos Rosa, Sophia de Mello Breyner, João Rui de Sousa, Cristovam Pavia, José Saramago, Casimiro de Brito, Ruy Belo ou António Reis. Estava munido, como poucos, para traçar retratos de panorâmica inclusiva da tradição literária portuguesa de 900, o que fez na sua tese de doutoramento, Tendências dominantes da poesia portuguesa da década de 50 (1991, depois publicada em 1996 e com 2.ª ed. em 2013). Leitor notável de Fernando Pessoa, ao autor de Mensagem dedicou um mapa da recepção no voluminho Pessoa e a moderna poesia portuguesa: do Orpheu a 1960 (1983) e a colectânea Aspectos do Legado Pessoano, 2022. Em Fernando Pessoa, justamente, centrou a sua actividade de investigador do CLEPUL, onde teve um papel fundamental, mesmo já depois da aposentação, na coordenação científica da série de colóquios e livros “Central de poesia”.Tinha um modo local de se relacionar, valorizando muito a presença (Portalegre e Régio, Santa Barbara e Sena). E a presença destacava-se de vários modos. Recorda-se, por exemplo, que entre o público do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, em performance de Wolf Vostell nos anos 80 do século passado, Fernando Martinho, divertido, era dos que mais reagia. Foi também autor de poemas (caminho de ocasião inaugurado com Resposta a Rorschach, de 1970) e cultivava o desenho, para que usava cartões, não raro recolhidos entre colegas da Faculdade de Letras; pedia-os com a mesma amabilidade com que depois os oferecia, sempre como agradecimento que achava necessário, mesmo que fosse por quase nada. Para ele e para os que com ele conviveram, foi sempre oportuno contar histórias de escritores, algumas pitorescas, que estão agora na memória dos seus discípulos e amigos, tal como o seu saber e bondade.