Praia Branca, Cabo Verde, 12 set 2022 (Lusa) – A morna Sodade, a mais conhecida de Cabo Verde e cantada por Cesária Évora, nasceu em Praia Branca, localidade na ilha de São Nicolau, que ganhou uma casa com o nome da canção para ser uma atração turística.
O nome pode ser sugestivo, mas a Praia Branca de praia não tem nada. É uma pequena e pacata localidade que dista uns 20 minutos de carro de centro do município de Tarrafal de São Nicolau, que já ascendeu a categoria de vila e é também conhecida como “terra d’sodade”.
Plantada no sopé das montanhas, com alguma vegetação e com o mar a três quilómetros, vive essencialmente da agricultura, e foi lá que nos anos 50 do século passado que Armando Zeferino compôs a morna Sodade (saudade), que foi celebrizada por Cesária Évora, tornando-se na canção mais emblemática e cantada de Cabo Verde.
A música tenta transmitir as saudades daqueles que deixavam a ilha em busca de uma vida melhor nas roças de São Tomé e Príncipe, na sequência das grandes secas e fomes que assolavam o país em meados do século passado.
E numa parceria entre o Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas, através do Instituto do Património Cultural (IPC), e a Câmara Municipal do Tarrafal de São Nicolau, com financiamento do Fundo do Turismo, a Praia Branca ganhou uma Casa da Morna com o nome dessa canção.
A primeira fase foi inaugurada em 17 de agosto de 2020 pelo ministro da Cultura, Abraão Vicente, e pelo autarca local, José Freitas de Brito, menos de um ano após esse género musical cabo-verdiano ter sido classificado pela UNESCO como património imaterial da humanidade.
“Tem sido um ponto turístico importante”, constatou à Lusa o autarca, recordando que recentemente foi realizada uma atividade na zona e os munícipes não ficaram com dúvidas que a casa levou mais movimento à vila e colocou Praia Branca “nas bocas do mundo”.
Pintada de azul no exterior, a casa convida o visitante a mergulhar na história desse género musical, com retratos dos muitos compositores e intérpretes, discos, cassetes, livros, folhetos, vídeos, instrumentos musicais, objetos pessoais, tudo ao embalo da morna, considerada a “música rainha de Cabo Verde” e o género mais representativo do contexto cultural das ilhas.
“Tem sido uma grande atração, e neste momento estamos a querer retratar a história de Praia Branca, não só a parte dessa morna, mas também da festa de São João, que é feita no mês de junho”, apontou José Freitas de Brito.
Para o presidente da Câmara Municipal, a ideia é diversificar o turismo, além do sol e praia, que é concentrado nas ilhas do Sal e da Boa Vista, e oferecer um pouco de música e sua história.
“Aqui em São Nicolau acho que nós temos tudo de Cabo Verde, temos praia, temos montanha, temos a nossa cultura e acreditamos que é a ilha que mais representa Cabo Verde em termos de cultura”, enfatizou.
Neste momento, disse que a autarquia está em processo de candidatura de Praia Branca para ser uma das aldeias turísticas de Cabo Verde. “E queremos que a Casa da Morna Sodade seja uma grande aposta da Câmara Municipal, em parceria com o Governo”.
Assim que for admitida como aldeia turísticas de Cabo Verde, José Brito já antevê as vantagens, sobretudo a nível de financiamentos para construção de infraestruturas básicas, como restaurantes e pontos de receção para os visitantes.
“Uma forma de as pessoas terem mais um ganha-pão nessa localidade”, salientou o autarca, lembrando que a Casa da Morna – Sodade foi instalada na antiga moradia do falecido Armando Zeferino Soares, em mais uma homenagem, além do festival da morna, iniciado em 2013.
Em 2021, no seu primeiro ano e meio de funcionamento, a Casa da Morna Sodade foi o segundo museu mais visitado em Cabo Verde, com 834 entradas (10%), atrás do ex-Campo de Concentração do Tarrafal, de Santiago, com 4.215 entradas (50% do total).
Para o IPC, a Casa da Morna apresenta-se com um “espaço de referência” para o conhecimento e fruição da morna através de um percurso que enaltece as vivências do cabo-verdiano na inspiração, surgimento e evolução deste género identitário, e “enobrece” a localidade de Praia Branca.
Além da Casa da Morna Sodade, Cabo Verde tem outro centro interpretativo da morna na ilha Brava, a Casa-Museu Eugénio Tavares, e prepara-se para abrir uma casa da morna na Boa Vista, ilha que é tida como o berço desse género musical.
Desde 2018 que a morna passou a ter um dia nacional, 03 de dezembro, dia de nascimento do compositor mindelense Francisco Xavier da Cruz ou B.Leza, uma das maiores referências daquele género musical.
A morna, género musical típico de Cabo Verde, foi proclamada em 11 de dezembro de 2019 como Património Imaterial Cultural da Humanidade pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura).
Geralmente acompanhada por viola, cavaquinho, violino e piano, o “instrumento de excelência da morna” é o violão, introduzido em Cabo Verde no século XIX.
RIPE // JH – Lusa/Fim