O ladino está em risco

Redação, 18 fev (Lusa) – No dia mundial das línguas maternas, 21 de fevereiro, um pequeno grupo celebra uma língua com um número cada vez menor de falantes, o ladino, espalhado por vários continentes após a expulsão dos judeus da Península Ibérica no século XV.

Para comemorar o dia, os produtores do documentário “Salvo pela Língua” – que narra a história de um dos quatro falantes de ladino de Sarajevo que sobreviveu durante a Segunda Guerra Mundial graças à língua – estão a organizar uma Semana da Língua Judeu-Espanhol com um festival online.

De 21 a 26 de fevereiro, serão disponibilizados quatro filmes/documentários e um projeto áudio sobre esta língua em risco de extinção em http://muestroespanyol.com/, disse à Lusa Susanna Zaraysky, produtora de “Salvo pela Língua”, o único que está legendado em português.

“Um dos objetivos do Dia Internacional das Línguas Maternas é chamar a atenção para a importância da preservação das línguas ameaçadas. A UNESCO estima que metade das 6.000 línguas existentes no mundo esteja em risco de extinção”, afirmou.

O festival online visa permitir que os cidadãos saibam um pouco mais sobre uma língua que teve origem nos judeus sefarditas expulsos da Península Ibérica durante a Inquisição, adiantou.

Segundo Susanna Zaraysky, a língua tem duas variantes principais, a Haketia, originária do Norte de África – uma mistura do espanhol do século XV com árabe, hebreu e francês – e os dialetos de judeu-espanhol que se desenvolveram nos Balcãs e na Turquia – uma mistura do espanhol do século XV com influências de turco, grego, hebreu, árabe, francês e línguas eslavas.

“Os materiais disponibilizados online ilustram a rica ‘tapeçaria’ de vozes do judeu-espanhol e o modo de vida sefardita em todo o mundo”, declarou.

O filme produzido por Susanna Zaraysky vai ser exibido no domingo na televisão da Bósnia, para comemorar o dia e narrar a história da língua ladina no país.

Uma tentativa de exibição em Portugal, durante um congresso que decorreu em Lisboa em dezembro último, não foi bem sucedida por falta de apoios, tendo o filme passado há um ano numa sinagoga no Rio de Janeiro, numa sessão em que estiveram presentes quatro falantes de ladino e elementos de um coro de música sefardita, disse.

“No Rio de Janeiro há um grupo de ladinofalantes, ‘Kaminando i Avlando’”, afirmou, tendo um elemento da comunidade judaica de Belmonte, no distrito de Castelo Branco, dito à Lusa que algumas palavras do ladino ainda são usadas entre a comunidade.

Bryan Kirschen, professor de linguística e de espanhol na Universidade do Estado de New York, em Binghamton, que trabalha com Susanna Zaraysky, disse à Lusa que, de acordo com o Ethnologue, a referência principal que cataloga as línguas do mundo, cerca de 100.000 pessoas ainda falam o judeu-espanhol no mundo.

“A língua encontra-se em risco de desaparecer, pois a maioria dos falantes do judeu-espanhol são mais velhos e não usam a língua com os seus filhos ou netos”, adiantou, realçando as “muitas iniciativas” feitas um pouco por todo o mundo para a preservação da língua.

De origem russa, a norte-americana Susanna Zaraysky fala oito línguas. Em 2014 esteve em Portugal para lançar o seu livro “Idioma é Música”, no qual procura ajudar outros a aprenderem idiomas como ela própria aprendeu, ouvindo emissões de rádio e música do país falante.

O documentário “Salvo pela Língua”, que relata a história de Moris Albahari, judeu sefardita de Sarajevo, salvo durante a II Guerra Mundial por saber falar ladino, aconteceu durante uma passagem pela Bósnia.

A trabalhar em Sarajevo em projetos de desenvolvimento económico no pós guerra, Susanna ficou “impressionada e surpreendida quando escutou orações cantadas em ladino na sinagoga”, ouviu depois as “kantigas” e sons e palavras que já não existem em espanhol mas existem em português, como “ch”, “trocar” ou “fazer”, disse à Lusa.

Decidiu contar a história de Moris Albahari porque “ver que ele sobreviveu à guerra com a ajuda de uma língua velha é 1.000 vezes mais forte que um gráfico” sobre línguas em extinção e porque pode ser um incentivo a que outras comunidades ajudem “a entender melhor a riqueza cultural existente na diversidade linguística do mundo”.

MLL // VM – Lusa/Fim
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