Lisboa, 27 nov (Lusa) – Os defensores da revogação do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90) consideram que as posições “revisionistas” do AO90 “são de rejeitar”, disse à agência Lusa Ivo Miguel Barroso, que tem contestado o Acordo.
“O destino adequado para o AO90 é o caixote do lixo”, disse Ivo Miguel Barroso, que alertou que “para ser revisto, é necessário que haja uma alteração do teor do Anexo I e II (Bases e Nota Explicativa)”, do Acordo.
Ivo Miguel Barroso falava à Lusa a propósito do anúncio feito pela Academia das Ciências de Lisboa (ACL) que vai apresentar ainda este ano um estudo para aperfeiçoar do AO90, sugerindo nomeadamente o regresso à utilização de algumas consoantes mudas.
“Quem conhece o Direito dos Tratados sabe perfeitamente que, se o AO90 é para ser revisto, é necessário que haja uma alteração do teor do Anexo I e II (Bases e Nota Explicativa). Ou seja, tal implicaria um novo Tratado ou uma revisão do mesmo entre todos os Estados da CPLP, no sentido de alterar o Anexo I do AO90”, afirmou.
“Ora, para que isso suceda, é necessário que todos os Governos dos Estados assinem; e que, depois, o novo Tratado seja ratificado internamente. Por outro lado, tal propósito de revisão significaria que pelo menos parte das normas do AO90 não seriam para cumprir”, realçou Ivo Miguel Barroso.
Em declarações à agência Lusa, o presidente da ACL, Artur Anselmo, salientou que a instituição não tem qualquer tendência política e que o AO90 é “um problema científico e não político”, que deveria de ser resolvido definitivamente, e que é utópico impor uma grafia igual em todos os países que falam português.
Ana Salgado, coordenadora do novo dicionário da Academia (que deve estar pronto em 2018), disse também que o acordo não estabelece uma ortografia única e inequívoca, o que permite várias interpretações e, por isso, causa instabilidade. O estudo da Academia pretende acabar com essa instabilidade.
Também em declarações à Lusa, a responsável frisou que a ACL não defende a revogação do AO90, mas sim o seu aperfeiçoamento, sendo que o que propõe são ajustes, como de resto a Academia brasileira já fez também.
A Academia vai, por exemplo, recomendar o emprego do hífen em algumas palavras (fará uma listagem), revelou Ana Salgado, ressalvando que o não emprego do hífen “não quer dizer que seja um erro”.
Quanto às consoantes que não se pronunciam a ACL vai defender que elas só caiam nos casos em que há uma grafia única em Portugal e no Brasil (como na palavra ‘ação’). No entanto, em casos como a palavra ‘recepção’ “a nossa leitura” (da ACL) é que a escrita com o ‘p’ é “legítima no espaço lusófono”. Na palavra ‘optica’, a ACL defende também o uso do ‘p’.
Ana Salgado lembrou que o AO90 está a ser aplicado no ensino desde 2011 e que muitas crianças poderiam não entender a reposição de consoantes, pelo que o trabalho da Academia é abrir essa possibilidade, uma “via para uniformizar”, e deixar que depois a língua evolua.
A ACL, adianta, não quer impor nada, mas defende a reposição do acento na forma verbal “para” (“pára”) e em todas as propostas vai justificar cientificamente as opções.
“Estou preparada para as críticas ao novo estudo”, disse a responsável.
Artur Anselmo também admite todas as críticas e diz que não faz sentido “abrasileirar” a ortografia do português, como não faz sentido moldá-lo à ortografia de qualquer outro país lusófono.