Macau, China, 28 fev (Lusa) – Muitos foram os que visitaram, curiosos, ao longo dos anos, o túmulo de Camilo Pessanha em Macau, uma sepultura discreta, com uma lápide em chinês, entalada entre jazigos vistosos no Cemitério São Miguel de Arcanjo.
“Não havia poeta, escritor, que não perguntasse por Camilo Pessanha. Quando vinham cá pessoas ligadas às letras, lá íamos mostrar [a campa]”, recorda o investigador Luís Sá Cunha, que fez parte de um grupo de intelectuais e amantes de Pessanha que, por diversas vezes, lhe prestaram homenagem no cemitério.
Sá Cunha, que ainda sabe de cor o caminho para a última morada do poeta, logo lançou o alerta, repetido por inúmeras pessoas, de que se trata de um túmulo difícil de encontrar.
A campa de Camilo Pessanha, discreta, encontra-se numa ponta do cemitério, com uma lápide escrita em chinês, identificável apenas pela pequena fotografia do poeta, com as suas barbas negras.
Situada entre três filas de túmulos, sem corredores a separar, obriga um visitante mais curioso a galgar as pedras vizinhas para se aproximar.
Na pedra tumular já só se consegue ler a primeira frase da inscrição “À saudosa memória do poeta”, que termina com “do seu filho J.M.P.”, uma referência a João Manuel Pessanha, que também está ali enterrado.
Nos anos 1990, Luís Cunha apresentou um projeto para um novo jazigo: “Tomei essa iniciativa porque há coisas sagradas. Várias pessoas juntaram-se para tratar disso”, recorda.
Era “um projeto simples”, com “quatro colunas e uma cobertura”, mas que carecia de autorização do Governo. No entanto, o tempo passou e o aval não veio.
“Insisti duas, três vezes e percebi que ia cair”, conta, não sabendo identificar um motivo concreto.
“Depois foi a transferência [da administração de Macau de Portugal para a China, em 1999], e foi uma espécie de muro que se ergueu”, comenta, lembrando como os portugueses andavam particularmente ocupados nessa altura, preocupados com o futuro, o que terá contribuído para o esquecimento da ideia.
Nessa época havia espaço em torno do túmulo para se erguer tal estrutura, mas “agora já não vale a pena, as campas [em volta] já estão muito em cima”.
Luís Cunha recorda como, antes de 1999, “havia uma certa peregrinação” à campa, que funcionava como uma “lavagem moral interior”.
Em particular, lembra a visita de Natália Correia, que além do cemitério, “queria ver tudo”, até “os ‘karaokes’ e as saunas” de Macau.
Quando estavam os dois no edifício na Avenida da Praia Grande onde em tempos esteve a casa de Pessanha, Sá Cunha perguntou: “Natália, sabes onde tens os pés? Na casa de Camilo Pessanha!”.
“Ela até deu um salto”, descreve.
“Por todas estas razões, acho que era obrigação dignificar o Camilo. E isso não se fez”, lamenta.
ISG // PJA – Lusa/fim
