A segunda versão do Encontro dos Escritores da Língua Portuguesa, iniciada ontem em Natal na sede da Academia Norte-riograndense de Letras, traz de volta à tona um assunto recorrente: o acordo ortográfico entre Brasil e Portugal. Hoje, logo mais a partir das 15h, o crítico e professor catedrático Carlos Reis ministra a conferência “O Estado e a evolução da Língua Portuguesa”, cujo ponto de partida será a forma com que a dinâmica do idioma é encarada pelas diversas esferas públicas e pelos atores inseridos no contexto, como professores e a própria academia.
Alex RégisCom viagem marcada, prefeita Micarla recebe os convidados para solenidade pela manhã no Palácio Felipe Camarão…
O tema foi alvo de recente polêmica levantada pelo jornalista e escritor português Miguel Sousa Tavares, que esteve no terceiro Festival Literário da Pipa – Flipipa – ocorrido este último fim de semana. O autor de “Equador” disparou sua metralhadora contra as mudanças ortográficas que tentam unificar o idioma português através da imposição de novas regras gramaticais. Na ocasião, Tavares garantiu que as diferenças nunca foram empecilho para a comunicação entre os dois países e que não irá respeitar o acordo.
Questionado sobre o posicionamento de Sousa Tavares durante a abertura oficial do EELP, realizada ontem pela manhã no salão nobre do Palácio Felipe Camarão, solenidade conduzida pela prefeita Micarla de Sousa e que contou com presença de autoridades e escritores convidados para o Encontro, Carlos Reis foi diplomático: “Não se trata de unificação da língua, isso seria coagir o idioma e quem pensa assim não sabe o que significa o acordo ortográfico na prática”, disse. “O que se busca com a mudança é um equilíbrio, até onde é possível. Não significa anular e sim minimizar algumas diferenças, uma tentativa de unificar a grafia”, esclareceu Reis.
Para ele, a intenção é “acabar com o estigma das duas grafias oficiais do português que dificultam o ensino e a disseminação do idioma no resto do mundo”, garante. Reis entende o acordo ortográfico como um instrumento político de regularização. “A língua é muito dinâmica, e o acordo respeita as diferenças – principalmente quanto à oralidade. E não é esse ou aquele escritor que irá impedir essa evolução do idioma”, alfineta.
Felizmente a controvérsia é salutar, e na opinião de Miguel Sousa Tavares tudo não passa de uma jogada das editoras interessadas em publicar livros sem tantas adaptações entre o português brasileiro e o europeu. “Vou continuar escrevendo como antes, o problema é que meu computador está começando a tentar me corrigir”, brincou Tavares durante o debate que participou no Flipipa, na sexta-feira passadda (18).
Sobre a conferência “O Estado e a evolução da Língua Portuguesa”, o catedrático adianta que sua abordagem pretende traçar um panorama sobre como os Estados que adotam o português como língua (oficial ou não) se relacionam com essa dinâmica linguística.
Durante a conferência ele pretende levantar algumas questões: como os países, cada qual com suas particularidades, lidam com essa evolução constante do idioma? Quais os instrumentos públicos e literários podem contribuir?
“Precisamos delimitar, orientar esse enquadramento, e queremos esclarecer que cada um tem um importante papel: o que os professores fazem? O que a academia está fazendo? O que os governos pretendem fazer? Há vários níveis de debate, é um feito em cascata onde tudo está interligado e no final das contas o que está em jogo é o futuro da língua que falamos e que através dela estamos historicamente ligados”, esclarece.
Rodrigo Sena…à tarde, os debates seguiram na Academia de Letras, com presença de Gabriel O Pensador na mesa sobre poesia
SEPARADOS PELO MAR
A solenidade que oficializou a abertura do segundo Encontro dos Escritores da Língua Portuguesa foi curta, mas uma fala chamou atenção pelo simples detalhe geográfico de que os países de língua portuguesa não são contíguos: “Todos estamos separados por mar, sem exceção, uma situação única no mundo”, disse Miguel Anacoreta Correia, secretário da UCCLA, instituição responsável por toda a construção da programação do EELP, que traz a Natal 25 convidados de outros países.
Miguel comemorou a possibilidade de, no próximo dia 27 de novembro na Indonésia, o Fado ser considerado patrimônio cultural da humanidade. “O mar sempre inspirou o Fado”, frisa, relacionando o estilo musical tipicamente português com a situação geográfica singular.
Ainda na solenidade de lançamento do EELP naa sede da Prefeitura, que começou com uma de atraso (às 11h) e ao som do Hino Nacional interpretado pelo flautista Carlos Zens, a prefeita Micarla de Sousa brincou com as diferenças do idioma e com a profusão de sotaques dentro do próprio Brasil. Citou a existência de um dicionário de Potiguês, onde estão listadas expressões tipicamente potiguares, e informou que não poderá acompanhar o Encontro de perto devido compromissos em Brasília, para onde viajou na tarde de ontem no intuito de participar de uma reunião do Comitê de Articulação Federativa entre prefeitos de todo o país – neste Comitê, Micarla é a atual representante dos prefeitos da região Nordeste. “Estou aqui aperreada com o horário do voo”, disse ela.
A programação de amanhã do EELP, cujo orçamento para realização do evento não foi divulgado pela Prefeitura, prossegue em torno da temática “Literatura de Viagens”, assunto abordado pelo escritor angolano Manuel Rui e mediado pelo professor do Departamento de Letras da UFRN Márcio de Lima Dantas.
FONTE: Tribuna do Norte