Trabalho de Vhils com comunidade indígena em exposição a partir de domingo em Brasília

Brasília, 11 jan (Lusa) – O trabalho resultante de uma residência artística que o português Vhils realizou em 2014 com índios no Brasil está em exposição a partir de domingo em Brasília, para chamar a atenção e “dar voz” a uma comunidade.

“Incisão” resultou de uma residência artística que Alexandre Farto (que assina Vhils) realizou em 2014 em Curitiba, capital do estado do Paraná, e na comunidade Guarani da Aldeia Aracaí, situada no mesmo estado.

“Fizemos uma série de intervenções na comunidade, com a comunidade, e convidámos parte a ir ao museu em Curitiba [onde ‘Incisão’ foi mostrada pela primeira vez, em 2014] para colaborarmos”, recordou o artista em declarações à Lusa, a partir de Brasília, onde está para a inauguração da exposição.

A mostra consiste numa instalação composta por 54 portas de madeira, “recolhidas na cidade”, lembrando “o processo de desenvolvimento e transformação que as cidades, aqui [no Brasil] particularmente, mas também em todo o mundo estão a sofrer”.

“Trabalhámos sobre elementos que sobravam deste processo de transformação”, disse. Nas portas foram cravados vários rostos e motivos indígenas, incluindo 18 retratos de habitantes da Aldeia Araçaí.

Quatro das peças foram feitas por artesãos da comunidade Guarani, durante a montagem da exposição em Curitiba, e outras duas resultam de um trabalho conjunto entre o artista e os elementos daquela comunidade indígena.

Em 2014, a ideia foi “levar a realidade da comunidade indígena para a cidade”. “É uma comunidade que foi quase empurrada para fora de onde estava, que foi afastada do desenvolvimento da cidade, pelo crescimento de parte da cidade”, afirmou.

Vhils recordou que aquela comunidade de Aldeia Araçaí “estava na altura a passar por uma realidade muito dura e por um processo de deslocalização [a comunidade teve que mudar de local, em 2000, depois de ter sido obrigada por um programa governamental a abandonar a terra onde vivia], que chocou com modos de vida muito tradicionais”.

No final do mesmo ano, a exposição foi mostrada também em Recife, capital do estado de Pernambuco, com a mesma intenção: “Chamar a atenção desta situação, que não era só particular desta comunidade, havia muitas em várias partes do Brasil que estavam a sofrer com esta situação”.

No ano passado surgiu novo convite, agora para levar a mostra até Brasília.

“Isto já estava a ser planeado há algum tempo, antes das eleições [presidenciais, que deram vitória a Jair Bolsonaro], mas acabou por ser algo que ficou bastante pertinente fazer-se agora, dadas todas as questões com o FUNAI (Fundação Nacional do Índio) e com a maneira como muitas destas transformações que estão a acontecer no Brasil estão a afetar estas comunidades ainda mais”, partilhou.

Para o artista, é “interessante perceber como um assunto que era atual na altura continua a ser, talvez ainda mais, atual hoje em dia”.

Através do seu trabalho, Vhils tem tentado dar voz a “pessoas e comunidades que ficam nas franjas [do nível de desenvolvimento que o mundo está a seguir] e numa luta”.

No Brasil, tem desenvolvido trabalhos, “com comunidades que vivem situações de confronto ou um pouco à margem do desenvolvimento que o país tem tido nos últimos anos”, desde 2011.

Nos trabalhos artísticos, tenta desenvolver “uma ideia de ativismo”, por isso “trazer estes assuntos para os espaços expositivos mais convencionais e institucionais fez todo o sentido”.

Nascido em 1987, Alexandre Farto captou a atenção a ‘escavar’ muros com retratos, um trabalho que tem sido reconhecido a nível nacional e internacional e que já levou o artista a vários cantos do mundo.

Em junho do ano passado, esteve em exposição no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, uma obra com retratos de três moradores do bairro 6 de Maio, na Amadora, que Vhils fez em colaboração com o investigador em Estudos Urbanos António Brito Guterres, que, nos últimos anos, tem desenvolvido trabalhos em vários bairros da periferia de Lisboa.

“Incisão”, de entrada gratuita, estará patente na Caixa Cultural Brasília entre domingo e 03 de março.

Além das 54 portas, a mostra inclui um painel composto por 15 fotografias que forma um tela, bem como vídeos de ações artísticas e do procedo de execução da técnica de trabalho do artista.

JRS // TDI – Lusa/fim
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