A escritora Sophia de Mello Breyner Andresen, cuja trasladação do corpo para o Panteão Nacional foi hoje (dia 21 de fevereiro de 2014) votada por unanimidade, pelo parlamento, é “uma das grandes referências cívicas” de Portugal, afirmou o presidente do Clube Pen Português, Casimiro de Brito.
“Sophia foi a maior poetisa do século XX e vai ficar para sempre na literatura portuguesa. Além disso, é o exemplo cívico e de qualidade humana”, disse à Lusa Casimiro de Brito, acrescentando que a sua opinião é “consensual” no meio literário e na sociedade portuguesa.
Natural do Porto, a autora faleceu no dia 02 de julho, na sua casa em Lisboa, aos 84 anos. Foi condecorada três vezes pela República Portuguesa e recebeu 13 prémios literários, entre outras distinções.
Faleceu dez dias antes de receber a Medalha de Honra do Presidente do Chile, por ocasião do centenário do nascimento de Pablo Neruda.
Sophia de Mello Breyner foi condecorada em 1981 com o grau de Grã Oficial da Ordem de Sant’Iago e Espada, em 1987, com a Grã Cruz da Ordem do Infante D. Henrique e, no ano seguinte, com a Grã Cruz da Ordem de Sant’Iago e Espada.
O Prémio Rainha Sofia de Espanha, em 2003, foi o último galardão que recebeu em vida, de uma lista de 12, iniciada em 1964, quando recebeu o Grande Prémio de Poesia da Sociedade Portuguesa de Escritores pelo livro “Canto sexto”.
Em 1977, “O nome das coisas” vale-lhe o Prémio Teixeira de Pascoaes e, em 1984, a Associação Internacional de Críticos Literários entregou-lhe o Prémio da Crítica pela totalidade da obra.
Em 1989, foi distinguida com o Prémio D. Dinis pelo livro de poesia “Ilhas”, que lhe valeu, no ano seguinte, o Grande Prémio de Poesia Inasset/Inapa. Em 1992, voltou a ser premiada pela totalidade da obra, desta feita, com o Grande Prémio Calouste Gulbenkian para Crianças.
A autora escreveu várias obras dedicadas ao público infanto-juvenil, nomeadamente, “A menina do mar” (1958), “A Fada Oriana” (1958), “A noite de Natal” (1959), “O Cavaleiro da Dinamarca” (1964), “O Tesouro” (1970), “A Árvore” (1985).
Em 1994, a Associação Portuguesa de Escritores outorgou-lhe o Prémio 50 anos de Vida Literária e, em 1996, foi homenageada no Carrefour des Litératures (França), um ano depois de ter sido distinguida com o Prémio Petrarca pela Associação de Editores Italianos.
Em 1998, o seu livro “O búzio de cós” valeu-lhe o Prémio Luís Miguel Nava e, no ano seguinte, recebeu o Prémio Camões.
Na cerimónia de entrega, o Presidente da República Jorge Sampaio salientou a “beleza tão alta e exata” que fez da sua obra “uma das criações em que nos revemos e de que nos orgulhamos”.
Nessa ocasião, em declarações à agência Lusa, a poetisa afirmou que foi numa viagem de autocarro que intuiu a natureza do mistério da poesia, ao reparar que a janela através da qual olhava coincidia por vezes com as janelas das casas.
“Pensei que talvez fosse isso: as palavras às vezes coincidiam com os seus significados, e depois deixam de coincidir, e voltam a coincidir outra vez”, disse.
Sophia escreveu os primeiros poemas aos 12 anos, mas só aos 24 anos publicou, às suas custas, o primeiro livro intitulado “Poesia”, numa edição de 300 exemplares editado em Coimbra.
A poetisa gostava de escrever sobre o verde, o mar, as ilhas, o amor e o trágico, mas não gostava que lhe perguntassem porque é que escrevia.
“O verdadeiro artista não inventa, vê”, afirmou numa das muitas entrevistas que deu, explicando que o artista “consegue apreender na natureza, nos elementos, o elo primordial que une o Homem ao Universo”.
“Quem escreve sobre uma árvore, entra em ligação com ela”, referia.
O Pen Club da Galiza entregou-lhe, em 1999, o Prémio Rosalia de Castro. Em 2001 recebeu o Prémio Max Jacob Étranger, que, pela primeira vez, distinguiu um autor não-francês. Este prémio surgiu na sequência da publicação de uma antologia de poemas seus, em França, intitulada “Malgré les ruines et la mort”.
Relativamente aos prémios, a escritora afirmou, em 1990, que estes se devem opor ao consumismo, pois definem um critério de escolha.
Além da literatura infanto-juvenil, com oito títulos editados, e da poesia, com 21 publicados, Sophia de Mello Breyner Andresen escreveu ensaio – “O Nu na Antiguidade Clássica” -, e teatro – “O Bojador” e “O Colar”, esta última levada à cena em 2002 pela companhia A Cornucópia.
Em 2012, a Porto Editora publicou um conto inacabado da autora, “Os Ciganos”, ao qual o seu neto Pedro Sousa Tavares deu continuidade, contando com ilustrações de Danuta Wojciechowska.
Além dos 37 títulos publicados nas diferentes áreas, e nove antologias, da autora há ainda vários poemas e textos dispersos.
Sophia de Mello Breyner Andresen destacou-se igualmente como tradutora de Dante, Paul Claudel, William Shakespeare, Leif Kristianson, Eurípedes, entre outros autores. A tradução de Dante valeu-lhe uma condecoração do Governo italiano.
A política não passou ao lado da vida da escritora, que lutou pela defesa da liberdade e da justiça. Assumiu-se como opositora à ditadura do Estado Novo, antissalazarista, pertenceu à equipa de fundadores da Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos e, em 1975, foi eleita deputada pelo Partido Socialista à Assembleia Constituinte, pelo círculo do Porto.
Sem nunca ter deixado de ter um olhar crítico e atento, preferiu, nos últimos anos, afastar-se da política ativa, tendo admitido “uma certa desilusão”. Em 1979 abandonou formalmente o PS.
Acerca dos políticos afirmou: “Têm a mania de construir de mais, mas a boa política é aquela que só faz o necessário”.
Mulher de fé – defendeu que a religião não condiciona o humano, “mas funda-o” – foi casada com o advogado e jornalista Francisco Sousa Tavares, falecido em maio de 1993, de quem teve cinco filhos.
“Esta é a madrugada que eu esperava/ O dia inicial inteiro e limpo/ Onde emergimos da noite e do silêncio. E livres habitamos a substância do tempo”, escreveu Sophia, sobre esse dia, 25 de Abril de 1974.
NL // MAG – Lusa/Fim