Tudo começou a 4 de Junho de 1939. O Serviço Mundial da BBC tinha sido criado um pouco antes, em 1932, para ajudar o governo britânico a promover a língua inglesa, assim como os valores e interesses britânicos no estrangeiro, objectivo que se aprofundou durante a Segunda Guerra Mundial.
O Serviço em Língua Portuguesa seria lançado a 4 de Junho de 1939, quando a propaganda nazi se intensificava, pouco antes do início da guerra e com grande ressonancia nos regimes ditatoriais na Península Ibérica, nomeadamente o de Salazar em Portugal e o de Franco na Espanha.
As primeiras transmissões da BBC para Portugal coincidiram com um período de censura bastante apertada.
A Inglaterra pretendia promover valores liberais e democráticos e servir de alternativa aos meios de comunicação social nacionais, sujeitos a censura.
Através da BBC, Portugal tinha acesso a informação independente e tornava-se mais ciente do seu isolamento a nível internacional.
Mas, em Agosto de 1957, o serviço seria encerrado por ser considerado menos importante para os interesses britânicos.
Foi reaberto em 1963, durante período de relações difíceis entre Portugal e a Grã-Bretanha. A tomada de Goa pelo governo indiano, o crescimento dos sentimentos nacionalistas nas então colónias portuguesas e as guerras de libertação fizeram com que o serviço voltasse a reconquistar ouvintes.
Em 1967, seria instalado um potente transmissor Atlântico para servir a crescente audiência em África – elite africana, militares e colonos.
Trabalhava na altura no serviço em português, Carlos Alves, cuja voz ajudou muitos ouvintes a aprenderem a falar inglês pela rádio.
A seguir à revolução de 25 de Abril de 74, enquanto que as audiências decresciam em Portugal, fruto do desenvolvimento de uma comunicação social livre e independente naquele país, estas aumentavam em África.
Este seria um factor determinante para a mudança do alvo da BBC em português, que iniciou o recrutamento de jornalistas africanos e passou a dar mais atenção aos acontecimentos e interesses das antigas colónias de Portugal em África, recém-independentes.
Manuel Santana chefiava a redacção em Londres nessa altura e esteve à frente deste serviço durante duas décadas até ao início dos anos 90. Entre os jornalistas africanos recrutados a partir dessa altura contam-se nomes como Guilherme Ismael, Carlos Araújo, Sulemane Cabir, Lígio Monteiro, São Lima e João van Dunem, que viria a chefiar a BBC para África entre 2001 e 2006.
Foram criadas parcerias com algumas rádios locais como a Rádio Bombolom na Guiné Bissau, a Rádio Nova em Cabo Verde e a Rádio Moçambique, onde a BBC tem ainda sete frequências próprias em diferentes pontos do país.
A política editorial da BBC de rigor e imparcialidade tornaria esta emissora como uma fonte alternativa de informação em países de partido único, com uma comunicação social extremamente controlada e censurada, como é o caso de Angola ainda nos dias de hoje.
Helena Sousa, professora de Estudos de Comunicação na Universidade do Minho, fez a sua tese de doutoramento sobre a BBC nos Palop.
No seu entender, nos anos das guerras civis em Angola e Moçambique, a BBC conseguiu oferecer aos ouvintes desses países aquilo que os orgãos nacionais, monopólio do Estado, não conseguiam.
Os anos noventa trariam mudanças políticas marcantes para alguns dos países africanos de língua portuguesa com o fim da guerra civil e abertura ao multipartidarismo, como foi o caso de Moçambique. O surgimento de uma imprensa independente viria originar uma maior competição no mercado da comunicação social.
Internamente, a BBC procedia a alterações estruturais para responder aos desafios tecnológicos e de mercado.
A passagem do sistema analógico, a gravação em fitas e cassetes para o sistema digital, em 2004 viria provar ser o passo certo, com, no entanto algumas dificuldades.
Ana Bonaldo, técnica de audio da BBC foi a responsável por formar os jornalistas da BBC para África e digitalizar as suas operações.
O avanço das tecnologias da comunicação, o rápido crescimento dos telemóveis em África e o alastramento da Internet e o próprio desenvolvimento das rádios locais levaram a BBC para África a ter uma oferta multiforme.
Teresa Lima, actual chefe do serviço liderou o processo.
Mas, a actual crise financeira global a que o Reino Unido não é alheio levou o governo britânico a encetar um programa draconiano de cortes orçamentais ao serviço público.
O Serviço Mundial não seria poupado. Um quarto da sua força de trabalho vai ser dispensada ainda este ano, devido a um plano de austeridade para poupar milhões de libras e que incluiu o encerramento de 12 serviços de rádios, como o serviço em português para África, em russo, mandarim chinês, espanhol para Cuba, vietnamita, inglês para as Caraíbas, entre outros.
Ao anunciar os grandes cortes em Janeiro passado, o director do Serviço Mundial da BBC diria que estes encerramentos não eram um reflexo do desempenho dos serviços ou dos seus programas . “Eles são extremamente importantes para as suas audiências e para a BBC”, disse. Mas sublinhou também a necessidade de grandes poupanças devido ao corte orçamental do governo.
Ao longo de 72 anos, o serviço português acompanhou a evolução dos tempos e das tecnologias, mantendo sempre o rigor editorial que caracteriza a BBC. As audiências estiveram sempre no centro das atenções.
FONTE: Angop