Primeiros jornais de Macau

Macau, China, 11 mai (Lusa) – Os primeiros jornais de Macau, nascidos no século XIX em língua portuguesa, foram essenciais para afirmar a identidade e a autonomia de Macau, política e económica, sendo palco de um “debate constante”, segundo a académica Cátia Miriam Costa.

A investigadora do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa esteve hoje em Macau para a palestra “Early Press in Macao: Claiming Autonomy and Identity in an International Context” (“Primórdios da Imprensa em Macau: A reivindicar autonomia e identidade num contexto internacional”), sobre o seu trabalho de análise dos periódicos de Macau entre 1822 e 1930, abrangendo 51 títulos.

Apesar de uma longa tradição de imprensa escrita, a “Abelha da China”, de 1822, é comummente considerada o primeiro periódico de Macau, uma versão que foi este mês contestada pela académica Agnes Lam, da Universidade de Macau, que, num livro lançado em Pequim, argumenta que o primeiro periódico se chamava “Iníco do Diário Noticioso” e nasceu em 1807.

Abelha_da_China_no1Ainda assim, foi pela “Abelha da China” que Cátia Miriam Costa começou, destacando a sua particular importância por “afirmar uma posição da comunidade macaense em relação à administração portuguesa”, explicou à Lusa.

Essa posição é uma de “autonomia, primeiro em relação à Índia, onde estava centralizada a administração portuguesa, mas também em relação à metrópole”. Ao “reivindicar uma identidade própria”, a comunidade local desejava conseguir “não só autonomia política, mas também para liderar os destinos económicos” do território.

Durante grande parte do século XIX a imprensa era essencialmente em português, contando também com alguns títulos em inglês, já que o primeiro jornal em chinês viria a nascer apenas em 1893, como destacável d’ “Eco Macaense”, conta a investigadora.

Eram jornais “bastante lidos”, apesar das tiragens muito reduzidas. “Funcionavam por assinaturas. As tiragens eram muito pequenas, mas um jornal era lido pela família toda, os barbeiros todos tinham jornais, os clubes as casas de chá”, disse.

Apesar de uma população pouco alfabetizada, “tinham impacto”, “respondiam uns aos outros” e isso era “visível no debate político”.

Não tendo todos a mesma raiz ideológica e tendo passado por diferentes fases, com “um período muito liberal, um muito republicano, com depois uma resposta mais conservadora”, eram marcados pela grande “preocupação com a sobrevivência económica da colónia” e por questões como a autonomia face a Goa e a diferenciação de Macau em relação a Hong Kong.

Por outro lado, alguns queriam “desenvencilhar-se de Timor, que durante um período de tempo está na administração de Macau, era uma administração conjunta, e era um peso, um fardo”. No entanto, “também há jornais a fazer essa ligação, dedicados ao Extremo Oriente português”.

Estes periódicos refletem uma “comunidade muito consciente da sua necessidade de sobrevivência” e que desenvolvia também aspetos culturais próprios, debatendo questões como a instrução pública ou as relações entre as comunidades portuguesa e chinesa.

“O debate é constante e muito interessante. Serviam para forçar o poder, para empurrar um bocadinho as suas questões”, aponta Cátia Miriam Costa.

O mapeamento dos jornais de Macau – alguns com coleções em “más condições” – é “muito importante” para se compreender “este movimento” intelectual que colocou uma cima da mesa questões ainda hoje em aberto.

“São coisas ainda latentes e que procuram dar um caráter específico a Macau”, sublinha.

ISG // VM – Lusa/Fim

 

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