A comunidade dos ‘tugu’, cristãos protestantes no maior país muçulmano do mundo, terá nascido do cruzamento de escravos de portugueses na Índia, que foram levados para a zona onde agora fica Jacarta, com comerciantes, artesãos e aventureiros oriundos de Malaca, Ceilão, Cochim e Calecute, mas não há versões definitivas da sua origem.
Os cerca de 300 ‘portugueses negros’ que vivem na aldeia de Tugu, a norte de Jacarta, seguem a tradição centenária de colocar pó branco na face uns dos outros, numa cerimónia realizada no primeiro domingo de janeiro.
Trata-se de um dos eventos mais conhecidos da comunidade e tem o nome de “mandi-mandi” (duche, em indonésio), que significa “literalmente tomar banho para limpar o corpo ‘sujo'”, disse à agência Lusa Lisa Michiels, uma das suas praticantes.
“Primeiro vamos orar juntos, ouvir a palavra do Senhor, como gratidão por todas as bênçãos de Deus. Depois, vamos almoçar juntos, antes de começar a cerimónia”, referiu.
Segundo a indonésia, o branco ou branco sujo “é como um símbolo de santidade e de perdão”, mas entre os descendentes de portugueses em Malaca, na Malásia, existe uma tradição semelhante na qual é usada “água em vez de pó”.
É também o perdão dentro das famílias que marca o momento das 12 badaladas e ainda o primeiro dia do ano, quando a tradição local – conhecida como ‘rabu-rabu’ – convida a ir de casa em casa pedir perdão, cantar e beber.
Os portugueses foram os primeiros europeus a chegar ao território atual da Indonésia, em 1512, e, embora a posterior colonização holandesa tenha tentado apagar as marcas da herança lusa, a língua papiá tugu, uma forma de crioulo, resistiu durante séculos.
O último falante deste crioulo faleceu em 1978, mas a língua continua a fazer parte das canções do ‘Keroncong’, um estilo de música popular que resultou da vinda do cavaquinho com os portugueses.
À semelhança de anos anteriores, as canções do grupo Keroncong Tugu – que é famoso na Indonésia e que reúne vários elementos da família de Lisa Michiels – deverão ter um destaque especial no “mandi-mandi”, que atrai indonésios de outros lugares e também estrangeiros, incluindo portugueses.
A comunidade – que conta também com alguns elementos noutros pontos da Indonésia e no estrangeiro – preserva tradições lusas, como beber vinho no Natal e no ano novo.
Até à geração dos pais da família Michiels, os ‘tugu’ procuravam sempre casar entre si, mas agora a situação é diferente, pelo que características físicas como o nariz mais pontiagudo deverão desaparecer com as gerações futuras
// APN – Lusa/Fim – Fonte: Público
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