Olha o passarinho, mas não te armes em carapau de corrida, e não me venhas com lágrimas de crocodilo, porque eu mando-te plantar batatas!
Isto não é a casa da mãe Joana e… não ande aos papéis!
A origem de seis expressões idiomáticas
Por Ana Salgado
Olha o passarinho!
Hoje as coisas já não se passam assim, mas antigamente para um bom retrato era necessário que as pessoas ficassem alguns minutos a olhar fixamente para a lente, dada a necessidade de um maior tempo de exposição na captura da imagem e da sua respetiva impressão.
De forma a manter a atenção de quem ia ser fotografado, e especialmente a das crianças, os fotógrafos tinham por hábito colocar uma gaiola com um passarinho diante da câmara. Aquando do momento de fotografar, o fotógrafo pedia às pessoas para olhar fixamente para a gaiola, garantindo desta forma a ausência de movimento, e proferindo:
— Olha o passarinho!
O passarinho voou… mas a expressão ficou!
Armar-se em carapau de corrida
Carapau de corrida é uma expressão popular usada para fazer referência a uma pessoa que se considera muito esperta. Usa-se frequentemente precedida do verbo armar: armar-se em carapau de corrida.
A origem da expressão não é certa, mas há algumas explicações possíveis.
Os carapaus são peixes muito rápidos, mas mesmo assim acabam por ser apanhados nas redes de pesca. Ou seja: mesmo que haja pessoas que se julguem muito espertas, estas também podem vir a ser apanhadas.
Uma outra explicação aponta para a venda do peixe. Ora, nas lotas o peixe é vendido em leilões invertidos, isto é, começa-se por anunciar o preço mais alto e este vai decrescendo até que um comprador o arremate. O peixe mais caro, ou seja, o melhor peixe, é vendido em primeiro. Os peixes de qualidade mais fraca ficam para o final.
As peixeiras que compravam o peixe de pior qualidade a um preço mais barato iam a correr até à vila para chegar ao mesmo tempo que as primeiras peixeiras que já lá tinham chegado com o peixe mais caro e de melhor qualidade que tinha sido vendido na lota em primeiro lugar. As últimas peixeiras chegadas tentavam enganar os clientes vendendo o seu peixe ao mesmo preço que as restantes. Nem sempre os fregueses se deixavam enganar e percebiam que aquele peixe era «carapau de corrida», de menor qualidade e trazido até à vila literalmente a correr.
Vai plantar batatas!
Expressão popular, muito curiosa, costuma ser usada para dizer a alguém que vá embora ou que pare de incomodar.
Esta expressão portuguesa terá surgido na época dos Descobrimentos, altura em que a agricultura não tinha muito prestígio porque a navegação e a pesca do bacalhau detinham todos os louros. Quem se dedicava à atividade agrícola era, por isso, gente considerada algo desqualificada. Depois veio a Revolução Industrial e a agricultura continuou a ser encarada como uma atividade menor.
Digamos que plantar batatas seria algo desprestigiante. Demorou algum tempo até que a batata se impusesse como um dos ingredientes de requinte em ementas portuguesas de culinária.
Mandar alguém plantar batatas é, assim, o mesmo que «deixe-me em paz e vá fazer algo sem sentido»!
Lágrimas de crocodilo
A explicação é científica: o crocodilo quando come pressiona os alimentos com força contra o céu da boca, comprimindo as glândulas lacrimais. Desta forma, as lágrimas caem enquanto mastiga ou devora os alimentos. Chorará por sofrimento ou pelo prazer de comer?
Assim surge a expressão lágrimas de crocodilo, ou seja, pelo facto de uma pessoa estar a chorar, não significa que está em sofrimento e pode apenas ser fingimento.
Isto não é a casa da mãe Joana!
Afinal quem é a Joana?
Remontemos ao século XIV. Ao que parece a expressão refere-se a Joana, rainha de Nápoles e condessa de Provença. Dada a sua vida moralmente desregrada e permissiva, esta dama acabou condenada pela Igreja a viver enclausurada em Avignon (França). Aí, vivendo refugiada em bordéis, Joana apoiou o funcionamento deste tipo de casas e protegeu os que viviam desse negócio. Joana era, assim, vista como uma mãe. A «casa da mãe Joana» passou a ser sinónimo de prostíbulo.
Atualmente, a «casa da mãe Joana» é o local em que cada um faz o que quer, onde imperam a desordem, a desorganização e a confusão.
Andar aos papéis
A expressão «andar aos papéis» tem origem nos trapeiros. E quem eram os trapeiros? Eram aquelas pessoas que revolviam o lixo em busca de comida e apanhavam trapos ou papéis na rua para vender. Ora, os trapeiros «andavam ao papel» e assim surge a expressão.
Nos tempos que correm, a expressão apresenta vários significados, como:
— não conseguir resolver um problema;
— estar com dificuldades;
— andar desnorteado.
Se tem andado aos papéis, pare um pouco e… pense nisto.