Em causa estão dois diplomas, ambos aprovados pelo Governo timorense em junho de 2014, promulgados pelo chefe de Estado em 24 de novembro último e publicados no Jornal da República a 14 de janeiro.
Além de remeterem o português como língua principal para mais tarde, os textos introduzem o conceito do uso da língua materna nos primeiros níveis de ensino, algo que altera o modelo em vigor nos últimos anos.
Recorde-se que o artigo 8 da Lei de Bases da Educação (de 2008) definia que “as línguas de ensino do sistema educativo timorense são o tétum e o português”, não fazendo em nenhum momento qualquer referência a línguas maternas.
O primeiro dos dois decretos publicados (3/2015) refere-se ao currículo nacional de base da educação pré-escolar e o segundo (4/2015) ao currículo do 1º e 2º ciclo do ensino básico, abrangendo todos os estabelecimentos de educação da rede pública.
Isso implica que estão incluídas as “escolas de referência” em Timor-Leste, projeto ao abrigo do qual estão deslocados em Timor-Leste, só no ano letivo 2014-2015, um total de 93 docentes portugueses.
As referências ao português são particularmente explícitas no decreto-lei 4/2015, referente ao primeiro e segundo ciclos do ensino básico.
“É garantida uma progressão gradual do Tétum ao Português, de modo a que esta última constitua a principal língua objeto da literacia e de instrução no terceiro ciclo do ensino básico, e que, no final do ensino básico, os alunos tenham adquirido um nível semelhante de conhecimento de ambas as línguas oficiais”, refere o artigo 17 deste texto.
Tal como ocorre no decreto sobre o pré-escolar, o texto reconhece o “uso da primeira língua” (dita língua materna) como “instrumento de acesso efetivo ao conteúdo curricular desta área de conhecimento, quando necessário”.
“A escolha da língua de instrução segue o ensino progressivo de línguas, utilizando a primeira língua dos alunos como um meio de comunicação de apoio, quando necessário”, nota.
Já no preambulo, o decreto-lei refere que até este documento “não se tinha dado a necessária atenção, dentro do programa curricular, à realidade multilingue e multicultural de Timor-Leste”.
“Com isto, e com base em resultados positivos de projetos-piloto já implementados, o currículo nacional de base determina um sistema claro de progressão linguística, capaz de garantir um sólido conhecimento de ambas as línguas oficiais”, refere.
“Ainda, o reconhecimento do uso da primeira língua das crianças, quando necessário, tem o potencial de assegurar o acesso a todos a educação, em condições de igualdade”, sublinha.
Também o decreto sobre o ensino pré-escolar, reconhece “o valor do uso da língua utilizada pela criança no ambiente familiar e na sua interação com a comunidade”, referindo-se a resultados positivos de projetos idênticos, que não identifica.
De acordo com o diploma, o currículo “será implementado de forma a garantir, através de uma progressão linguística que, no final da educação pré-escolar, as crianças possuem uma base de linguagem oral numa das línguas oficiais”.
“O currículo nacional, refletindo a sociedade multilingue e multicultural timorense, faz uso da primeira língua das crianças como instrumento de acesso efetivo ao conteúdo curricular desta área de conhecimento, quando necessário”, refere.
“Com o objetivo de preparar a criança para o ensino básico, caso a língua de interação entre a criança e o educador não seja uma das línguas oficiais, o estabelecimento de educação pré-escolar deve implementar sessões de ensino focadas no desenvolvimento da oralidade em Tétum”, refere, por seu lado, o artigo 17.
ASP // PJA – Lusa/Fim
Fotos LUSA:
– A Escola Portuguesa Ruy Cinatti em Díli tem mais de 800 alunos, a maior parte dos quais timorenses, e tem oito centenas de famílias a aguardarem vagas para os seus filhos, Dili, Timor-Leste, 9 de novembro de 2013. ANTONIO AMARAL/LUSA