INTRODUÇÃO
Está muito longe o ano de 1987, quando o professor Luís Filipe Lindley Cintra me propôs realizar um estudo sobre a fala barranquenha. Já naquela altura me sentia atraída pelo conhecimento e investigação nas línguas minoritárias, graças ao entusiasmo que por elas tinha mostrado o meu mestre Alonso Zamora Vicente nas suas aulas, nos passeios por Madrid e nas viagens, culturais e linguísticas, que com alguns alunos e professores – Pedro Peira, Antonio Viudas ou Ruy Belo – ele organizava. Também me deixaram uma importante impressão os trabalhos de campo que, em alegre camaradagem, levámos a cabo com o professor Ramón Blanco Carril para a cadeira de Fonética Experimental. Este livro é fruto de um prolongado processo de formação, mas também de um trabalho intenso de recolha e interpretação de dados, bem como uma síntese exaustiva final, que espelha a aventura de uma pesquisa realizada em quase trinta longos anos da minha vida académica e profissional.
Nas páginas que se seguem, dá-se a conhecer, de forma completa e sistemática, a investigação que, sobre o barranquenho, tenho vindo a realizar, desde aquela recuada data, integrado no projecto do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa Línguas Border Project: Barranquenho, do qual sou a única responsável. A pertinência deste estudo manifesta-se em dois aspectos. Por um lado, a necessidade de aprofundar a investigação existente, necessidade reconhecida pelo próprio J. Leite de Vasconcelos (1955: 31-32) e confirmada por Manuel Alvar (1957: 316) na recenção que fez à monografia do filólogo português. Por outro lado, pela atenção crescente que se tem vindo a prestar às línguas em contacto. Existe, de facto, um grande “interesse em especificar as restrições dos modelos de código misto, com a intenção de contribuir para o avanço do trabalho teórico no âmbito dos universais da linguagem”1 (Milroy 1987: 184). 1 Todas as traduções são da autora. 20 MARÍA VICTORIA NAVAS Estuda-se o barranquenho em si mesmo como resultado do contacto linguístico entre o português (variedade alentejana) e o espanhol2 (variedades extremenha3 e andaluza), e também desde uma perspectiva variacionista, isto é, tendo em conta o sexo, o grau de formação e a idade dos informantes na realização da sibilante em posição final e na concordância do sintagma nominal. Além do mais, contemplam-se aspectos morfossintácticos, léxicos e de literatura oral e tradicional.
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