Lisboa, 08 mai 2023 (Lusa) – A investigadora Patrícia Costa lançou um projeto para divulgar o crioulo de base portuguesa do Sri Lanka nas redes sociais porque considera que há “um interesse crescente” nas comunidades lusodescendentes em preservar a língua.
“Há agora um conjunto de jovens que lançou, justamente em abril deste ano, aulas [de crioulo português] para jovens e crianças”, sublinhou Patrícia Costa, investigadora do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa.
O mesmo grupo tem também procurado dinamizar ações para promover a língua no Sri Lanka, onde “a maior parte da população desconhece totalmente que existe esta comunidade de euro-asiáticos e desconhece que há uma língua totalmente diferente”, referiu Costa.
Um desses jovens, Derrick Keil, lançou em fevereiro uma versão moderna de uma canção tradicional em crioulo português, Minha Amor, após ter participado no programa de talentos The Voice Sri Lanka.
“É um marco importante na história da comunidade, porque pela primeira vez temos uma música dirigida a audiências várias que tem o crioulo como língua”, disse Patrícia Costa.
Curiosamente foi a comunidade de falantes do crioulo português que introduziu no Sri Lanka a “baila”, que pode ser considerada atualmente o género de música mais popular no país.
Patrícia Costa e uma jovem falante da língua, Vyvonne Joseph, lançaram também, em 2020, o projeto Preserving Sri Lanka Portuguese, nas redes sociais Instagram e Facebook.
A investigadora disse que a iniciativa pretende, por um lado, “dar a conhecer a audiências mais gerais, também fora do Sri Lanka a existência desta língua, porque mesmo em Portugal não há uma grande consciência de que estas comunidades crioulófonas existem”.
Por outro lado, acrescentou Costa, o projeto quer “auxiliar, com materiais didáticos simples, aqueles que são membros da comunidade e que procuram aprender a língua”.
O crioulo português do Sri Lanka “neste momento é uma língua definitivamente ameaçada. O número absoluto de falantes é bastante reduzido”, por volta de 1.300, sendo que a maioria são “pessoas mais velhas”, lamentou a académica.
Para os jovens, “aprender o crioulo português não tem o valor instrumental” que as línguas oficiais do Sri Lanka, o cingalês e o tâmil, têm, no acesso à educação e ao emprego, referiu Costa.
Além disso, disse a investigadora, alguns membros da comunidade “sentem que é uma língua obsoleta” ou têm “algumas conceções erradas” de que aprender o crioulo português em casa pode prejudicar a aprendizagem de outras línguas na escola.
Mas Costa sublinhou que o eventual desaparecimento do crioulo português do Sri Lanka “não é uma fatalidade inescapável”.
“É possível minimizar este perigo, com algumas ações e com a concertação de investigadores, ativistas e os próprios membros da comunidade”, acrescentou.
A académica defendeu ainda que uma maior ligação com os países falantes de português “seria muitíssimo vantajoso para as comunidades crioulófonas, que teriam uma espécie de reconhecimento oficial da sua existência, da sua importância e da sua herança”.
O crioulo português do Sri Lanka, antigo Ceilão, é uma herança da expansão marítima portuguesa no século XVI, quando nasceu como língua de contacto entre cingaleses e portugueses, os primeiros europeus a lá chegar.
A colonização portuguesa da ilha não durou mais de 150 anos, mas, mais de meio século depois, este crioulo continua a ser falado no seio das comunidades burghers, tradicionalmente católicas.
Estas comunidades identificam-se como burghers – palavra que significa “cidadãos” em holandês – e o termo passou a designar-se para todas as pessoas que tivessem uma ascendência euro-asiática incluindo os portugueses e também os holandeses, no Sri Lanka.
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