Glossário: O dicionário da crise da dívida na Zona Euro

A crise da dívida soberana colocou na ordem do dia termos como “default”,  rating, juros da dívida ou siglas como FEEF ou MEE. O Negócios preparou um dicionário para que entenda melhor a grave crise económica e financeira que afecta a Zona Euro.


Credit Default swaps (CDS)
. Os CDS são contratos que permitem ao investidor garantir o recebimento do capital investido em obrigações, na eventualidade de o emitente entrar em incumprimento. Na prática, funciona como umseguro. Em troca, o investidor paga ao emitente dos CDS, regra geral um banco de investimento, uma taxa de juro ou comissão. Estes contratos foram introduzidos em 1995 pelo JPMorgan.

A cotação dos CDS é expressa em pontos base, que representam o prémio que o investidor tem de pagar acima da taxa de juro de referência para a maturidade das obrigações que está a proteger.

Default. Um emitente de dívida entra em “default” (incumprimento) quando se vê na impossibilidade (ou na indisponibilidade) para cumprir com os termos de acordos financeiros previamente estabelecidos junto de credores.

Em teoria, ainda que seja muito comum que empresas e pessoas individuais possam entrar em “default”, os países não podem declarar “falência”. Mas podem incorrer em dificuldades de tesouraria e de incapacidade de acesso aos mercados financeiros que obriguem a um processo de reestruturação da dívida. Esse é, aliás, um receio assumido em relação à dívida de alguns países da Zona Euro, o que explica os juros elevados que continuam a ser exigidos pela dívida da Grécia e da Irlanda, países que já foram auxiliados pela UE e pelo FMI.

Perante uma situação de insolvência, um emitente inicia geralmente um processo de renegociação dos contratos: que pode passar por uma extensão dos prazos acordados ou, mesmo, pela redução do valor a reembolsar ao investidor – um processo conhecido como “haircut”.

Eurobonds ou obrigações europeias.Emissão de dívida pública através de títulos europeus. 

Há três propostas, apresentadas pelaComissão Europeia, para levar à prática a possibilidade de os Estados do euro emitirem dívida pública através de títulos europeus. Não há consenso sobre nenhuma das opções.

1. Financiamento integral

Os Estados deixariam de emitir títulos próprios e passariam a financiar-se integralmente através de obrigações europeias, garantidas solidariamente pelos países do euro. A sua emissão ficaria a cargo de uma Agência Europeia – um Tesouro europeu. 

A “yield” subjacente tenderia a aproximar-se da alemã, que é a mais baixa. É a opção mais radical, com maior potencial para estabilizar os mercados e travar a crise, mas também a que envolve maiores riscos de desincentivar os endividados a fazer poupanças e, nessa medida, a que maiores probabilidades tem de ser chumbada pela Alemanha. Exige também alterações (demoradas) aos Tratados, para reescrever a cláusula de “não-regaste”. 

2. Financiamento parcial

É em tudo idêntica à anterior, mas os Estados só poderiam usar obrigações europeias (“títulos azuis”, com “yields” mais baixas”) para financiar parte da sua dívida – é referido 60% do PIB, que reflecte o valor máximo “tolerado” pelos Tratados. 

A partir desse tecto, os Estados teriam de emitir obrigações próprias (“títulos vermelhos”). Impacto de estabilização dos mercados é menor, mas “moral hazard” também. Exige igualmente mudar Tratados. 

3. Garantias parciais

Estados financiam-se com ‘eurobonds’ até a um determinado limite, mas, ao contrário da opção anterior, estes seriam apenas parcialmente garantidas pelos 17 países do euro, com base no respectivo peso. Fraco potencial de estabilização do mercado e de descida dos juros (“yields”). Grande vantagem é que poderia ser aplicada quase de imediato, sem exigir alterar os Tratados.

Eurogrupo. Instituição que reúne os ministros da Economia e Finanças dos Estados-membros da Zona Euro. É presidida por Jean-Claude Juncker, primeiro-ministro (e antigo ministro das Finanças) do Luxemburgo. 

“Haircut”. O “haircut”, que numa tradução literal corresponde a “corte de cabelo”, traduz a perda que um investidor está na iminência de suportar num determinado activo. A dimensão do “haircut” reflecte a percepção de risco associada ao activo. Por exemplo, o “haircut” que está a ser negociado com os bancos e entidades financeiras privadas que compraram títulos de dívida da Grécia é de 50%. O objectivo é criar melhores condições para que o remanescente da dívida possa ser efectivamente ressarcido.

“Fiscal compact” ou “novo pacto orçamental” reforçado. Esta é uma nova expressão no léxico europeu e foi usada pela primeira vez por Mário Draghi, o novo presidente do Banco Central Europeu (BCE), para designar um acordo orçamental mais rígido entre os países da Zona Euro e da União Europeia, com objectivos orçamentais e sanções automáticas.

A expressão foi imediatamente adoptada por Herman Von Rompuy, e surge no comunicado da Cimeira de 8 e 9 de Dezembro, como um passo para uma “genuína ‘união orçamental de estabilidade'”. 

http://www.consilium.europa.eu/uedocs/cms_Data/docs/pressdata/en/ec/126658.pdf

Entre as principais medidas acordadas estão a introdução de uma nova regra orçamental nas constituições dos vários países (ou nível equivalente) que estabeleça que os défices orçamentais estruturais anuais não possam ultrapassar os 0, 5% do PIB e a aplicação de mecanismos de correcção automática em caso de violação da regra.

Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF).FEEF foi criado a 9 Maio de 2010 – pouco tempo após a Grécia ter pedido ajuda externa – com o objectivo de salvaguardar a estabilidade financeira da Europa, através da concessão de assistência financeira temporária aos seus Estados-membros.

A 24 de Junho de 2011, os chefes de Estado e do Governo chegaram a acordo para aumentar o âmbito e a base de capital de 440 mil milhões de euros para os 780 mil milhões de euros, o que corresponde a uma capacidade efectiva de empréstimo de 440 mil milhões de euros. 

O FEEF está autorizado a emitir obrigações ou outros instrumentos de dívida no mercado para obter os fundos necessários para ajudar os países em dificuldades financeiras. 

O FEEF está registado no Luxemburgo e é detido pelo Estados-membro da Zona Euro. É presidido por Klaus Regling (na foto), antigo director-geral para os assuntos económicos e financeiros da Comissão Europeia. 

Mecanismo de Estabilidade Europeu (MEE). O MEE é o sucessor do FEEF. É umMecanismo Permanente, ao contrário do FEEF, e deverá entrar e vigor em 2012 (inicialmente estava prevista a sua entrada em vigor apenas em 2013 mas na cimeira europeia de 8 de Dezembro os líderes europeus decidiram antecipar para Julho de 2012). Esta alteração está, no entanto, dependente da ratificação por um número de Estados-Membros que representem 90% dos compromissos de capital. 

Na cimeira europeia de 8 de Dezembro foi ainda decidido substituir a “regra do comum acordo por uma maioria qualificada de 85% caso a Comissão Europeia e o BCE constatem que é necessária uma decisão urgente relacionada com a assistência financeira quando a sustentabilidade financeira e económica do euro estiver ameaçada”.

O MEE pode ser accionado a favor de um Estado do euro que esteja a “atravessar ou esteja ameaçado de problemas de financiamento severos” e se esta intervenção se revelar “indispensável para salvaguardar a estabilidade da Zona Euro como um todo”.

O MEE, que ficará sedeado no Luxemburgo como o seu antecessor, terá uma capacidade efectiva de empréstimo de 500 mil milhões de euros, assente numa base de capital de 700 mil milhões de euros, o que lhe garantirá, à partida, “rating” máximo – e, logo, custos de financiamento mínimo para os Estados a que ele recorram.

Tal como o FEEF, o essencial da base de capital do novo mecanismo permanente será assegurada por garantias (620 mil milhões de euros) fornecidas pelos países do euro. Mas o MEE terá também 80 mil milhões de capital próprio, que lhe será transferido pelos Estados, de acordo com a sua participação no capital do BCE.

O MEE poderá fornecer empréstimos de curto ou médio prazo a um país do euro que esteja a ter dificuldades em financiar-se, mas poderá também comprar dívida pública quando esta é emitida pelo Estado em apuros, no chamado mercado primário.

Mercado de dívida primário e secundário. Nos últimos meses, o acompanhamento noticioso da turbulência na dívida da Zona Euro tem regularmente feito alusão aos mercados primário e secundário. A distinção é simples: omercado primário diz respeito ao momento em que novos títulos de dívida são introduzidos, seja através da reabertura de uma linha de crédito seja através da inauguração de uma nova linha. Os leilões de bilhetes e Obrigações do Tesouro pelo IGCP são um exemplo de funcionamento do mercado primário. 

mercado secundário diz respeito à negociação posterior desses títulos que chegaram ao mercado através dos leilões (mercado primário). Quem adquire os títulos no mercado primário não conserva os mesmos até à maturidade, em alguns casos. Os fundos de investimento, por exemplo, negoceiam as obrigações como se de acções se tratasse (através de múltiplas plataformas, como o MTS).

Nesse fluxo, o preço das obrigações pode flutuar, sendo que quando o preço de uma obrigação baixa, o juro (“yield”) associado sobe, e vice-versa. Por isso, quando se diz que os juros da dívida sobem vários dias seguidos, isso significa que são os títulos existentes que estão a ser negociados no mercado secundário que estão a trocar de mãos a preços cada vez menores (e juros maiores). A relevância do mercado secundário é que dá uma ideia da pressão sobre cada emitente a cada momento, isto porque normalmente os custos de financiamento nos leilões ficam próximos dos preços no mercado secundário.

Rácio “core tier one”. Este indicador de solvabilidade ajuda a medir a saúde financeira de uma instituição e é calculado tendo em conta a relação entre os capitais próprios de um banco e o valor dos seus activos ponderados pelo risco.

A Autoridade Bancária Europeia (EBA, sigla original) estabeleceu que os bancos europeus precisam de alcançar um core tier one de 9% até final Junho de 2012. 

Os bancos portugueses necessitam de 6, 95 mil milhões de euros para alcançar esta meta (tendo em conta os dados referente ao final de Setembro passado). A este montante já é possível, no entanto, retirar 1, 5 mil milhões de euros correspondentes às operações de reforço de capitais próprios realizados entretanto. 

No total, os bancos europeus precisam de 114, 7 mil milhões de euros para reforçar os rácios de capital, até Junho de 2012, tendo em conta as perdas assumidas com a dívida europeia.

Além desta exigência, o Banco de Portugal (BdP), no âmbito do acordo assinado entre Portugal e a troika internacional, impôs que os bancos portugueses tenham um core tier one mínimo de 10% até ao final de 2012. 

Apesar de ambas as autoridades definirem exigências em termos de core tier one, há diferenças na forma como EBA e BdP calculam este rácio. O indicador da autoridade europeia é mais exigente, uma vez que obriga a que, para efeitos do apuramento do rácio, os bancos deduzam ao valor dos seus capitais próprios as diferenças entre os valores de balanço e os valores de mercado da dívida soberana europeia detida a 30 de Setembro de 2011, além de outros elementos, como as participações em instituições financeiras. 

Rating.
“Rating” é uma classificação atribuída à qualidade da dívida que é emitida por empresas, mas também pelos Estados. E é utilizada para medir a probabilidade de incumprimento no pagamento dessa mesma dívida, sendo que, normalmente, é essa nota que vai ditar o nível de juros a pagar.

Essa classificação, ou “rating”, é essencialmente dada a obrigações e outros títulos de dívida das empresas. Mas no caso de se tratar de um país, é a dívida pública que fica sujeita a análise, sendo que quanto mais elevado for o “rating” atribuído, maior capacidade que a empresa/país tem de para pagar um juro mais baixo pelas suas obrigações (títulos de dívida).

Existem diversas empresas de “rating” que oferecem os seus sistemas de notação. São elas a Moody´s, Standard & Poor´s ou a Fitch, todas norte-americanas, que atribuem notações financeiras desde AAA, o mais elevado, até ao C ou D, o mais baixo, consoante a tabela de classificações da agência que atribui o “rating”.

Os títulos de dívida com uma classificação entre AAA e BBB-, de acordo com a tabela de notação da Standard & Poor’s, são considerados como “investment grade”, sendo as obrigações de empresas e dívida pública com “rating” de BB+ ou inferior definidas como “especulativas”.

Standard & Poor’s Fitch Ratings Moody’s Significado
AAA AAA Aaa Qualidade mais alta
AA AA Aa Qualidade alta
A A A Qualidade média/alta
BBB BBB Baa Qualidade média
BB BB Ba Predominantemente especulativo
B B B B B Especulativo, baixa classificação
CCC CCC Caa Insolvência próxima
CC CC Ca Mais baixa qualidade, sem interesse
C C C Insolvente, em atraso, questionável
D Insolvente, em atraso, questionável

“Rating” de “lixo”. Aos olhos da Moody’s e da Fitch, a dívida da República Portuguesa já tem uma classificação “junk”, traduzido para “lixo”. Isso significa que o “rating” com que Portugal se financia nos mercados (e também o selo com que os bancos entregam dívida nacional como colateral para operações de financiamento) passou para um patamar inferior àquele que a agência de “rating” considera ser um “investimento de elevada qualidade”.

“Rollover” da dívida. Esta operação consiste na extensão de um contrato financeiro, para lá da sua data de vencimento inicialmente fixada. Trata-se de um conceito que pode ser utilizado em vários mercados, como é o caso da dívida e dos futuros.

 

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