Redação, 07 dez (Lusa) – A escritora Marília Garcia, vencedora do Prémio Oceanos de literatura, anunciado hoje, em Lisboa, nasceu há 39 anos, soma cinco livros, um deles publicado em Portugal, e tem o hábito de desbravar, nos seus poemas, “as espirais da linguagem”.
Conquistou o Prémio Oceanos com “Câmera Lenta”, o seu mais recente livro, com que afirmou o seu lugar como “uma das vozes mais originais da poesia contemporânea”, ao refletir “sobre as múltiplas espirais da linguagem”, como destaca a sua editora, a Companhia das Letras.
“Depois de ‘Teste de resistores’, Marília Garcia dá continuidade à sua pesquisa sobre o processo poético”, escreve a Companhia das Letras, na apresentação da obra.
“Na última parte de ‘Câmera Lenta’, ela dedica-se a uma profunda análise sobre as hélices do avião e sobre a vontade de decifração. O poema, aqui, é o lugar para experimentar, exercitar o pensamento ‘ao vivo’ e testar procedimentos novos, sempre em aberto”, adianta.
O ensaísta brasileiro Italo Moriconi diz da escritora, que recebe agora o seu primeiro prémio de literatura de dimensão plurinacional, que tem uma “poética desbravadora, sofisticada, antenada”, sintonizada.
Marília Garcia, escritora e tradutora radicada em São Paulo, cita o poeta Henri Michaux na sua mais recente entrada no ‘blog’ da Companhia das Letras: “A verdadeira poesia faz-se contra a poesia”, escreveu, com as palavras do autor belga de língua francesa.
“A má vontade com o poema pode ser saudável, talvez ela ajude a produzir uma pausa para a reflexão, uma espécie de desautomatização. Muitas vezes é preciso escrever (e ler) contra a nossa própria ideia de poesia ou contra certo impulso inicial do poema”, diz a poetisa brasileira, na entrada do ‘blog’, datada do passado dia 22 de novembro.
Coeditora da revista de poesia Modo de Usar & Co, publicada ‘on-line‘ até há um ano (com os poetas Angélica Freitas, Fabiano Calixto e Ricardo Domeneck), Marília Garcia também fez parte do grupo fundador da editora Luna Parque, com o escritor Leonardo Gandolfi.
Dedicada em particular à poesia, a Luna Parque publicou autores como os norte-americanos Frank O’Hara, Kenneth Goldsmith, Lesli Kaplan, a francesa de origem russa Nathalie Sarraute, os brasileiros Alice Sant’Anna, Augusto Massi, Bruno Brum e Carlos Augusto Lima, Leonardo Martinelli, Reuben e Roy David Frankel, entre outros, além da revista Grampo Canoa.
Em Portugal, Marília Garcia tem publicado o livro “Um Teste de Resistores”, pela Mariposa Azual (2015), e a antologia “A Poesia Andando: Treze Poetas no Brasil”, editada pela Livros Cotovia (2007), com poemas de Carlito Azevedo, Augusto Massi, Heitor Ferraz Mello, Felipe Nepomuceno, Aníbal Cristobo, Fabiano Calixto, Marcos Siscar, Simone Brantes, Walter Gam, Ricardo Domeneck e Angélica Freitas.
Marília Garcia nasceu em 1979, no Rio de Janeiro, formou-se em Letras, doutorou-se em Literatura Comparada e soma cinco livros, publicados nos últimos dez anos: “20 Poemas para o seu Walkman” (2007), “Engano Geográfico” (2012), “Um Teste de Resistores” (2014) e “Paris Não Tem Centro” (2015), que antecederam “Camera Lenta” (2017).
Traduziu, entre outros autores, Emmanuel Hocquard, Gertrude Stein e Kenneth Koch.
No ‘blog’ da Companhia das Letras, sobre o processo de construção do poema, escreveu: “(…) Queria escrever um poema que tivesse a palavra ‘coração’. Como usar uma palavra tão batida sem soar pesado? Como remover da palavra os usos e o lugar comum? Tendo o coração se tornado palavra gasta, seria possível voltar o coração contra o coração?”
Depois de percorrer a relação de vários poetas com a palavra, de Vinícius e João Cabral de Mello Neto, a Manuel Bandeira e Drummond de Andrade, Marília Garcia detém-se em “Osso do Coração”, poema-fábula de Zuca Sardan, em que a personagem principal de uma peça sobrevive a todos. No final, arranca o coração do próprio peito, tira-lhe a pele até só sobrar o osso, no qual vai gravar que “todo mundo se matou por ilusão”. “Talvez este osso ilustre bem a ideia de coração contra o coração”.
“Se a gente prestar atenção e fizer silêncio”, escreve Marília Garcia num dos poemas de “Camera Lenta”, livro premiado, “pode ser que ouça/ alguma mensagem /perdida no ar”.
MAG // SR – Lusa/Fim
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