Maria Teresa Soares, secretária-Geral do Sindicato dos Professores nas Comunidades Lusíadas (SPCL)
9 de março de 2016
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O ensino da Língua e Cultura Portuguesas destinado a lusodescendentes está cada vez mais caraterizado por aberrações, contradições e injustiças várias.
Apesar de ser um tipo de ensino consagrado na Constituição da República Portuguesa, Artigo 74°, alínea i), na qual consta incubir ao Estado assegurar aos filhos dos emigrantes o ensino da língua portuguesa e o acesso à sua cultura, o termo “assegurar” tem sido interpretado de forma extremamente livre, pois embora seja sinónimo de garantir, para os alunos dos cursos de Português na Suíça, grande parte da Alemanha, Reino Unido e metade do Luxemburgo, assim como para aqueles dos cursos do ensino associativo em França, a garantia não existe, visto que o acesso ao ensino da Língua e Cultura identitárias só é possível mediante pagamento da vergonhosa taxa de frequência, a chamada Propina.
E com a Propina surge a primeira grande aberração neste ramo de ensino, pois a receita de cerca de milhão e meio de euros, proveniente dos países atrás mencionados, está a ser distribuída por 18 países na totalidade, incluindo aqueles onde nem sequer existem cursos a cargo do Estado Português, nomeadamente os Estados Unidos da América do Norte, a Venezuela, o Canadá e a Austrália. Portanto, cerca de 4 países pagam e 18 usufruem.
A Propina paga pelos lusodescendentes na Alemanha pode ser, por exemplo, parcialmente usada para comprar livros para os alunos na Austrália. Parte das quantias auferidas na Suíça ou junto das associações em França poderão ser, também, usadas para cobrir gastos na África do Sul ou ajudar a pagar os vencimentos dos dois Coordenadores de Ensino nos Estados Unidos, apesar de, como já dito acima, não existirem nesse país cursos a cargo das entidades portuguesas.
Mas as aberrações não terminam aqui. Atualmente, tanto em Espanha como em França, no chamado ensino integrado, que tem lugar dentro do horário letivo normal, há alunos franceses e espanhóis a usufruirem de aulas de Português a título gratuito, dadas por professores pagos pelo Instituto Camões. Em França atingiu-se já o extremo de haver professores que, nas suas turmas, não têm um único aluno português.
Portanto, aulas de Português grátis para estrangeiros mas pagas pelos lusodescendentes, a quem, segundo a Constituição, se destinavam.
Serão estas aberrações consequência das políticas de ensino preconizadas pelo Instituto Camões que, a dada altura decidiu que, como o ensino tem lugar no estrangeiro, os alunos são todos estrangeiros e o Português deve ser lecionado na vertente língua estrangeira, com manuais e certificado a condizer? Certamente que sim. É inegável que tanto o referido Instituto como o atual Secretário de Estado das Comunidades, Dr.Jose Luís Carneiro, têm manifestado uma fortíssima preferência pelo ensino do Português como língua estrangeira, inserido nos currículos escolares dos países de acolhimento. Como a realidade demonstra, estão até dispostos a sacrificar os Portugueses nas Comunidades, obrigando-os ao pagamento da Propina, para que os alunos estrangeiros possam ter aulas de Português gratuitas. Uma situação insólita?
Certamente. Impatriótica? Sem dúvida. Anticonstitucional? Claro! Mas, segundo os responsáveis, amplamente justificada pela obscura “dignificação da nossa língua e da nossa cultura”. Restará questionar se a pretensa “dignificação” passa por oferecer a estrangeiros de graça aquilo que se está a vender aos Portugueses. E como o milhão e meio de euros é muito mais importante do que qualquer tipo de justiça, mesmo a mais básica, iniciaram-se já as inscrições pagas, um processo que rouba toda a dignidade aos docentes, pois os transforma em angariadores de matrículas e recetores de comprovativos de pagamento, dado que sem inscrições em número suficiente se arriscam ao desemprego.
Haverá ainda dúvidas de que todos os procedimentos mencionados, a saber: pagamentos obrigatórios e ensino de Português como língua estrangeira, aliados a manuais inadequados e a muito fraca qualidade de ensino, com alunos de quatro, cinco ou até mais anos de escolaridade diferentes amontoados numa só turma, estão lenta mas inexoravelmente a conduzir à exclusão dos Portugueses, dando preferência aos estrangeiros?
A verdade é que nem o Instituto Camões, nem a Secretaria de Estado das Comunidades falam de melhorar a qualidade de ensino ou as condições de trabalho dos professores. Até agora limitaram-se a insistir na necessidade de manter a Propina.
Juntando tudo o relatado anteriormente, é fácil compreender com que objetivos: acabar com os cursos nas pequenas localidades e manter um ensino de aparência nas cidades com grandes concentrações de Portugueses, privilegiando o Português para estrangeiros e excluindo a Língua e Cultura Portuguesas nas Comunidades.