“Considero ambos os países o meu lar: não me sinto nem mais chinês, nem mais português”

Pequim, 04 abr (Lusa) – Filho de emigrantes chineses, nascido e criado em Portugal, há 29 anos, Filipe Hu trabalha agora em Pequim na secção portuguesa de um dos maiores órgãos do Estado chinês, a Rádio Internacional da China (CRI).

“Faço de ponte entre os dois países”, diz sobre a sua posição como único jornalista de nacionalidade portuguesa no mais antigo serviço noticioso na língua de Camões da China continental.

Criado em 1960, aquele departamento conta ainda com dois brasileiros e mais de 20 chineses, todos licenciados em português. Desde há três anos assegura seis horas da programação diária da Rádio Íris FM, nos arredores de Lisboa.

Filipe Hu concretizou em 2012 o percurso contrário ao que os seus pais fizeram há 30 anos, quando deixaram a província de Zhejiang, leste da China, rumo a Lisboa.

Formado em chinês pelo Instituto Politécnico de Leiria, veio para cumprir um intercâmbio na Universidade de Língua e Cultura de Pequim (BLCU), considerada uma “míni-ONU”, com cerca de 9.000 alunos estrangeiros.

“Tendo as raízes chinesas, era uma obrigação aprender a língua”, realça.

Após concluir os estudos, decidiu ficar: “A China é tão grande, há tanta coisa para descobrir, porquê voltar?”.

Optou então por fazer o estágio curricular na secção consular da embaixada portuguesa em Pequim: “Foi bom para aprender como funciona o intercâmbio entre Portugal e a China”.

Amante de um bom bife da pedra (“quem é que não gosta?”) e açorda de marisco (“uma maravilha!”), Filipe é categórico: “Sinto-me tão bem aqui, como em Portugal”.

É “simpatizante” do Benfica, vai ao ginásio “três ou quatro vezes por semana” e continua a preferir música ocidental, mas, em Pequim, ninguém diria que nasceu do outro lado do mundo.

“Considero ambos os países o meu lar: não me sinto nem mais chinês, nem mais português”, atira.

Já os pais de Filipe fazem parte da segunda geração de emigrantes chineses: “Passam a maioria do seu tempo num ciclo de pessoas da comunidade”.

Os avós, que viveram em Portugal “cerca de três anos”, no início da década de 1980, constituem a primeira.

Na sua casa em Lisboa, em dezembro, também se faz a árvore de natal e colocam-se enfeites relativos à quadra. No entanto, na noite da consoada, não há rabanadas ou bacalhau.

“Os chineses preferem sempre a sua culinária”, destaca o jovem.

A entrevista decorreu na zona antiga de Pequim, num dos raros “hutongs” – os típicos becos da capital – que não foram arrasados para dar lugar a torres de escritórios e altos blocos de apartamentos.

Naquele quarteirão, cuja origem remonta ao século XIII, os ‘lao beijingren’, (antigas famílias de Pequim), coabitam hoje com centenas de jovens ‘laowai’ (estrangeiros, no jargão local).

Nas mercearias, algumas com menos de dez metros quadrados, cervejas belgas e alemãs, e até a portuguesa Super Bock (‘Chaoji Boke’), multiplicam-se nas prateleiras, junto às coloridas garrafas de ‘baijiu’, a aguardente chinesa.

Neste novo circuito urbano, pizzas, hambúrgueres, cachorros, ou o tradicional falafel israelita, convergem com as gastronomias de diferentes províncias chinesas.

Filipe Hu prefere, no entanto, olhar para além do perímetro da capital. A China “são vários mundos”, explica.

Esta semana, obteve a carta de condução de moto e planeia em breve partir pela estrada fora rumo à descoberta do país mais populoso do planeta.

“Explorar já está na veia do português”, conclui.

JOYP // PJA – Lusa/fim
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