Intervieram nesta sessão o Embaixador Marcello Mathias, como presidente e moderador, o Prof. Manuel Braga da Cruz e o Dr. José Ribeiro e Castro, conferencistas, e a jornalista Ana Sousa Dias, como comentadora.
Marcello Mathias, explicitou os objetivos desta conferência e, uma vez feita a apresentação dos intervenientes, falou sobre o tema em debate, e disse:
O idioma de um país, como tudo aquilo que tem a ver com a projecção externa de uma realidade nacional, é uma afirmação de todos os instantes, no sentido de uma luta permanente, mormente hoje em dia em que se assiste a uma feroz guerra cultural – tanto mais difícil de travar quando há crescente escassez de meios e recursos, como é infelizmente o nosso caso.
A diferença entre as guerras culturais e as outras, as militares ou as comerciais, é que não existem estatísticas, embora também existam vitimas. Daí a extrema relevância em afirmarmos a língua portuguesa em conjunto e em articulação com os nossos parceiros da CPLP, que como todas as instituições comporta em si um efeito multiplicador da influência de todos aqueles que a integram. É uma dinâmica que a todos beneficia.
O Prof. Manuel Braga da Cruz (nota curricular) na sua intervenção começou por dizer que falar da internacionalização da língua o obrigava a falar da internacionalização da cultura porque a língua é matriz da cultura, identificando a cultura lusófona como uma realidade complexa, híbrida e diversificada que ultrapassa o âmbito linguístico. Ela nasceu do cruzamento de povos, de diferentes culturas e línguas.
Apontou os traços distintivos da cultura lusófona, referindo como primeira característica uma raiz humanística de inspiração cristã, sublinhada por Jaime Cortesão quando escreve que na expansão se buscava “não apenas as terras mas também os homens” e por Camões ao celebrar “A fé e o Império”. Uma segunda característica assenta no patriarcalismo e no comunitarismo, embrião de organização social, que os portugueses reproduziam à medida que se expandiam nos territórios ultramarinos, o que lhe permitiu sobreviver em contextos adversos.Também o modo de exprimir-se por uma religiosidade tolerante, aberta à diferença e humanizante, “metíamos Deus em pequenas casas”, explicado por Jorge Dias como “activismo contemplativo” é outra das suas características. Finalmente, explicitou que a cultura lusófona se manifesta na saudade e, citando Carolina Michäelis de Vasconcelos, refere não ser apenas uma memória triste e dolorosa de uma presença ausente mas que se espera recuperar no futuro, e que se caracteriza por ser utópica, escatológica com dimensão fáustica no seu lirismo.
Seguidamente, abordou a cultura lusófona de matriz linguística portuguesa como uma cultura dispersa pelo mundo. Ao contrário de outras realidades linguísticas que estão concentradas geograficamente (pan-eslavismo e pangermanismo), a cultura lusófona é uma cultura de diáspora que atravessa a totalidade dos continentes, que está em expansão e exibe as seguintes atributos que constituem vantagens para a sua internacionalização: existe em unidades dispersas e dilaceradas (Timor- Leste); é pluricontinental, pois está disseminada por todas as terras e pela totalidade dos continentes; tem uma significativa diversidade ética e racial; regista fluxos pluridireccionais com importantes fluxos de retorno, resultando daqui uma característica nova – deixou de haver subordinação de uns povos a outros para passar a haver uma paridade cultural; tem um suporte político organizado – a CPLP- e tem capacidade para atrair falantes de outros países.
Finalmente, afirmou que a Língua Portuguesa e a Cultura Lusófona são realidades em expansão, devendo perguntar-se que estratégia para a presença e para a expansão? Perante realidades de diáspora e de diversidade, haverá que encontrar estratégias múltiplas com capacidade de adaptação às diferentes realidades, citando alguns exemplos como a preservação de núcleos (Macau, Goa, Malaca), a expansão e fomento do seu ensino em países que pretendem que a Língua Portuguesa seja uma realidade na sua sociedade (Guiné-Equatorial) e a sua afirmação em comunidades lusófonas espalhadas pelo Mundo provenientes de áreas culturais diversas. Sendo, pois, uma realidade de dinâmicas identitárias e plurifacetadas, exige respostas através do fomento de redes culturais que potenciem o tecido lusófono.
O Dr. José Ribeiro e Castro (nota curricular) começou por se referir à época dos Descobrmentos portugueses, tempo em que a língua se disseminou e se afirmou – séculos XVI a XVIII – como língua franca e língua veicular no Oriente. No século XX, com a descolonização nasceram estados que elegeram o português como língua oficial.
Centrou depois a reflexão na Línua Poruguesa como a terceira língua europeia global e falou da experiência concreta a partir do Parlamento Europeu: uma longa luta de oito anos de perguntas, intervenções, cartas e propostas.
Recordou 3 datas:
- 8 de Abril de 2003: resolução do parlamento europeu sobre decisão do Governo da Região Administrativa Especial de Macau, com o apoio expresso do Governo da República Popular da China, de afirmar e consolidar a posição de Macau como centro de relacionamento entre a China e os países de língua oficial portuguesa. É reconhecido, na resolução, a posição de Macau como um pólo privilegiado de relacionamento da China com todo o espaço da lusofonia a nível mundial, tendo presente que a língua portuguesa é, em número de falantes, a terceira língua europeia de comunicação universal.
- 15 de Novembro de 2006: Resolução do Parlamento Europeu sobre um novo quadro estratégico para o multilinguismo, onde se afirma que algumas línguas europeias são também faladas em muitos outros países terceiros e constituem um importante elo entre povos e nações de diferentes regiões do mundo, que algumas línguas europeias se prestam particularmente ao estabelecimento de uma comunicação directa com outras regiões do mundo e se reconhece a importância estratégica das línguas europeias de comunicação universal como veículo de comunicação e como forma de solidariedade, cooperação e investimento económico e, por conseguinte, como uma das principais directrizes da política europeia em matéria de multilinguismo
- 18 de Setembro de 2008: acolhimento por parte do Conselho Europeu, do Comité Económico e Social Europeu e do Comité das Regiões das teses do Parlamento Europeu – o multilinguismo é uma mais-valia para a Europa, o valor de negócio das línguas e a dimensão externa do multilinguismo.
José Ribeiro e Castro abordou depois o que denominou “A minha teoria dos quatro recursos nacionais”: as pessoas, o território, a posição geográfica e a língua. Quanto à língua, perguntou: “Como é que é pobre um país que tem uma língua falada por 250 milhões de pessoas?
Considerou haver uma paupérrima consciência dos recursos nacionais.
Sobre o Acordo Ortográfico referiu a importância que ele assume no quadro do desenvolvimento de uma estratégia comum (“a Língua não é nossa, também é nossa” – Adriano Moreira).
O Português é língua da Europa, língua de África, língua das Américas, língua do Oriente.
Concluiu, dizendo: Sejamos optimistas, só há 30 anos adquirimos estatuto de língua internacional.
Seguiu-se a intervenção da comentadora Ana Sousa Dias (nota curricular) que, reltivamente a questões actuais, manifestou as seguintes preocupações:
- Preocupa-me em primeiro lugar o papel futuro do organismo que vai resultar da fusão do Instituto Camões e do IPAD, uma vez que têm funções muito distintas. E desde logo me parece absurdo que o nome “Camões” deixe de constar no título do futuro instituto. Não imagino que a Alemanha retire o nome de Goethe ou a Espanha o de Cervantes dos respectivos institutos.
- Preocupa-me a anunciada redução de horas de aulas de Português no ensino não superior em França e na Alemanha, onde existem comunidades portuguesas muito numerosas e que poderão aumentar nos próximos tempos com o aumento da emigração.
- Preocupa-me o conteúdo do relatório sobre a reestruturação do sector público da informação, nomeadamente a RTP e a Lusa, instrumentos decisivos no fortalecimento dos laços entre os países da CPLP.