A língua portuguesa é cheia de armadilhas para os mais desavisados. A pressa ou mesmo a falta de atenção podem levar um jornalista experiente a publicar uma manchete, digamos, pornográfica. Dúvida? Basta fazer uma busca na internet, que, provavelmente, vai se deparar com a chamada do UOL Cuba lança acesso wi-fi ou a pegadinha de um jornal cearense “Quadrilha explode banco e usa escudo humano”.
(…) Antes de mais nada, é preciso esclarecer o que pode ou não ser considerado um cacófato. Sérgio Nogueira, consultor de língua portuguesa do jornalismo da Rede Globo, explica que a cacofonia só existe quando “palavras juntas criam um som desagradável ou mesmo um palavrão”. No entanto, ele defende que, com o passar do tempo, o conceito de cacófato foi se ampliando de forma que palavras que antes não seriam consideradas de baixo calão entraram na barca desse vício de linguagem.
“É sempre bom lembrar o famoso alma minha que aparece no poema de Camões. Numa época em que maminha não tinha nenhuma conotação sexual, acho um exagero achar que isso era um cacófato.” (…)
(…) Braços dados com o humor
Apesar de perseguido pelos linguistas mais puristas, o cacófato já foi inspiração de marchinha de Carnaval: O Brasil vai lançar um foguete/ Cuba também vai lançar/ Quero ver se Cuba lança/Quero ver Cuba lançar. O chamado vício de linguagem nasceu de braços dados com o humor e a ironia.
Nogueira acredita que muitos cacófatos acabaram sendo inventados ao longo do tempo exatamente para fazer graça. “Cuba lança me parece que está nessa lista.” Para Moreno, esse humor com as palavras geradas pela cacofonia mostra “o lado criativo e bem-humorado da linguagem”. Ele acredita que os caçadores de cacófatos “procuram pelo em ovo”, uma vez que “muitos exemplos precisam de explicação, porque quem está lendo nem os percebe.
O fato é que com o passar dos anos e a evolução da língua, o jornalismo “adotou” a cacofonia para lançar manchetes de duplo sentido, como, por exemplo, “Cuca indo”, frase usada para anunciar a saída do técnico de um clube mineiro. “Hoje há uma tolerância maior para o cacófato, mesmo na imprensa. Uma manchete de jornal com um dos cacófatos mais famosos como esse acaba virando piada. Não se sabe se o veículo mantém de propósito para viralizar e levar a notícia para outras paragens, divulgando o nome do jornal”, atesta Lilian Passarelli.
Mesmo que hoje os cacófatos sejam mais aceitos, é na linguagem falada que eles ficam mais explícitos. Um exemplo clássico dos escorregões que a cacofonia pode gerar aconteceu durante a narração de um jogo da seleção brasileira: Fábio Conceição pediu a bola e Cafu deu. Para Moreno, embora a língua falada seja o campo de ação do cacófato, é preciso ter o ouvido ligado para sacar de cara o palavrão. “Dia desses ouvi em um programa de culinária na TV o apresentador dizer: não gosto de descascar alho. Ler o artigo completo.
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