Praia, 21 out (Lusa) – Silvenius, pseudónimo que o escritor e poeta cabo-verdiano Arménio Vieira criou na década de 70 para preservar o anonimato, regressa no décimo livro do escritor, uma antologia poética, que será lançada hoje na cidade da Praia.
O livro, com 150 páginas, atravessa toda a produção poética do autor, desde os primeiros poemas assinados com o pseudónimo Silvenius no então jornal Voz di Povo, passando pelos livros publicados ao longo de décadas de produção literária e terminando em quatro poemas inéditos.
A antologia, que assinala os 40 anos do que viria a tornar-se no poeta satírico Silvenius, será apresentada pelo também poeta e Presidente da República Jorge Carlos Fonseca e pelo escritor português residente em Cabo Verde Nuno Rebocho.
O livro, o quinto que publica com a chancela da editora Rosa de Porcelana, é o décimo do autor galardoado com o Prémio Camões em 2009.
Em entrevista à agência Lusa, Arménio Vieira, que por estes dias está em Cabo Verde para lançar o livro, mas que reside agora habitualmente em Portugal, explicou ter-se sentido “picado” para fazer a antologia pelas críticas de um outro poeta cabo-verdiano, cujo nome não mencionou.
“Um bom poeta cabo-verdiano disse que eu antes de ganhar o prémio Camões publicava um livro de 10 em 10 anos. Escrevia, burilava, filtrava e depois saia e saia muito bem. Depois do prémio disse que comecei a disparar e a jorrar e de quatro livros passei para nove e que o que tinha publicado ultimamente, se tivesse feito uma seleção, seria um bom livro”, recordou o poeta na conversa com a agência Lusa.
“Ainda bem que ele fez a crítica porque esta seleção se calhar é melhor. Foi bom, senão não faria a antologia”, acrescentou, adiantando que foi limitado na escolha dos poemas pelo número de páginas e que não incluiu poemas para agradar.
Ainda assim, acredita que a antologia vai ter que ter outro volume porque há poemas que ficaram de fora.
“0s meus leitores vão dizer: caramba, não incluiu os poemas de que gostava”, prevê o poeta.
Sobre Silvenius, faz questão de esclarecer que se trata de um pseudónimo criado para assegurar o anonimato.
“É pseudónimo, não é heterónimo, não é alter ego, não é nada disso. Surgiu porque na altura preferia o anonimato porque alguém podia sentir-se tocado por esses poemas”, disse.
O pseudónimo deriva do último apelido do poeta que além de Arménio se chama também Adroaldo, “sobrenome medonho”, que ganhou de um mártir cristão levado para Roma por Nero, escolhido pelo seu pai que era agnóstico, não o batizou e nunca foi à missa.
“Não queria assinar com o meu nome completo. Tenho um sobrenome medonho que até nos registos se atrapalham sempre: é Adroaldo, mas põe sempre adorado, abalroado? este Silvenius, vem do meu último nome que é Silva”, contou divertido.
Quanto aos poemas inéditos da antologia agora publicada, Arménio Viera destaca o que regista a primeira vez que viu um cipreste.
“Fiz um poema sobre a primeira vez que vi um cipreste. Não conhecia, costuma estar nos cemitérios, está ligado à morte. Foi num funeral qualquer. Eu não gosto de funerais. Não quis ir ao funeral do meu pai. Não gosto de cemitérios, nem de hospitais”, diz.
Regista a propósito que muitos dos amigos do seu grupo da esplanada do Café Sofia, onde para sempre quando está em Cabo Verde, têm morrido, alguns até com menos que os seus 75 anos.
“Estão morrendo, as pessoas morrem”, constata, mas assegura que isso não o faz pensar na sua própria morte, nem tão pouco aspirar a ser imortal.
“Não temo a morte. Não desejo a imortalidade, seria horrível”, diz, logo lembrando a história de alguém a quem uma deusa ofereceu um dom e que optou pela imortalidade.
“Escolheu mal, escolheu a imortalidade e continuou a envelhecer. Quando queria morrer foi ter com a deusa e ela disse-lhe: estás condenado a não morrer porque escolheste mal, foste estúpido, devias pedir a juventude eterna e não a imortalidade. Ser eterno velho é mau negócio”, assegura Arménio Vieira, que diz manter vivo o seu lado infantil, o lado que gosta de festa,
“Há um poema neste livro onde digo que é bom fazer anos, mas que em vez de velas preferia estrelas. As velas apagam-se. Há sempre um tom de morte nos poemas. Sou um indivíduo alegre, mas parece que sou pessimista”, afirma.
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