A apresentação integral de “Os Lusíadas” é um projeto de António Fonseca, que data de 2008, quando começou a decorar os dez cantos que constituem o poema de Camões.
Defende o ator que “Os Lusíadas”, de “uma oralidade viva, [têm] um sabor da palavra gostosa que é própria dos bardos, dos aedos [declamadores de epopeias, na Grécia Antiga], dos jograis, dos Antónios Aleixos que nos restam”.
“É um livro para ser entoado por recitadores e não analisado por gramáticos”, remata o ator, num comunicado enviado à Lusa.
A primeira apresentação da integral de “Os Lusíadas” aconteceu no ano passado, em Guimarães, no âmbito da Capital Europeia da Cultura, precisamente no dia 10 de junho, que a tradição assinala como tendo sido quando Luís Vaz de Camões faleceu, no ano de 1580, contaria então 55 anos.
António Fonseca voltou a recitar “Os Lusíadas” na íntegra, em março passado, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, e volta a fazê-lo, na próxima segunda-feira, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, no Jardim de Inverno do Teatro São Luiz, a partir das 10:00.
“De hora a hora, é dito um canto, com 10 minutos de intervalo, entre cada um. Entre o canto terceiro e quarto haverá uma hora para almoçar e, entre o canto nono e o décimo, duas horas e meia para jantar; pelas 23:30, um grupo de dez atores diz o décimo canto”, juntando-se a António Fonseca, explicou à Lusa fonte do Teatro Municipal. Este grupo é constituído por Almeno Gonçalves, Carlos Malvarez, João Vicente, Natália Luiza, Marta Dias, Raquel Castro, Rita Durão, Sofia Marques, Tónan Quito e Vítor Andrade.
A declamação do poema épico, que conta a viagem marítima de Vasco da Gama, em 1492, de Lisboa a Calecut, evocando vários episódios da História de Portugal e imaginando uma trama mitológica clássica, é acompanhada por um ambiente musical criado por Fernando Mota.
Em comunicado enviado à Lusa, o ator afirma que, “para nós portugueses, ‘Os Lusíadas’ são a maneira maior de contarmos um tempo de diversas formas, inscrito nos nossos cromossomas”.
O ator salienta que o poema realça a forma como os portugueses dos séculos XV e XVI contribuíram para alterar a “mundivisão ocidental”.
Neste período, “as paredes se romperam e os mares muito maiores que o Mediterrâneo, entraram de enxurrada num mundo que estava cartografado havia mais de mil anos”.
Para António Fonseca, “Os Lusíadas”, publicados em 1569, são também “uma súmula do saber que resistiu ao tempo e que continua a resistir: os factos são históricos, ou ‘poético-históricos’, mas as suas profundas motivações são de todos os tempos”.
Neste sentido, o ator sublinha “a precisão e agudeza e, às vezes, crueza, com que Camões as formula, embrulhadas nos processos poéticos, que podem deixar-nos o resto da vida a meditar”.
Justificando a leitura da obra épica de Camões, o ator afirma: “A catadupa de mudanças políticas, sociais e, sobretudo, económicas a que vimos assistindo, exige-nos o reforço da nossa identidade individual e coletiva, das âncoras de cumplicidade que temos de ir buscar mais longe, fora da efemeridade do presente”.
“Verifico frequentemente, no contacto com as pessoas, que a obra de Camões tem esse condão”, frisa.
A obra é também, segundo o ator, “objeto de estudo e, nessa qualidade, de amor, ódio, admiração e de memória coletiva”.
NL // MAG – Lusa/Fim
Foto: Um exemplar da primeira edição de “Os Lusiadas” faz parte do espólio do Ateneu Comercial do Porto, conhecida por edição princeps, (1572), Porto, 11 de Dezembro de 2009. JOAO ABREU MIRANDA / LUSA