A Primeira Dança em Goa

Grupo de danças e cantares de Goa EKVAT, Casino do Estoril, 23 de Novembro de 2019

Apaixonada que sou por Goa, sempre que aparece um novo livro cuja temática seja Goa, tenho que me apoderar dele. Neste caso até foi mais interessante, pois fiquei a saber do livro A Última Dança em Goa antes mesmo de ser publicado.

O autor do livro – Joaquim Correia, contactou-me pois tinha encontrado na Hemeroteca de Lisboa um anúncio em Concanim (língua oficial de Goa) e queria saber o que significava. Assim começou a nossa troca de emails e quando o livro foi lançado na Casa de Goa (Associação em Lisboa) em 2018, já tinha uma ideia do conteúdo.

Recentemente tive o prazer de voltar a relê-lo e aproveitei para ter mais dois dedos de conversa com o autor sobre a sua obra.

Para quem nada conhece sobre a cena musical de Goa, considerem este livro como uma primeira dança. Os primeiros passos ainda incertos num território por descobrir. Achei curioso como é que um português se dá ao trabalho de passar meses na Hemeroteca de Lisboa e na Biblioteca Nacional à procura de anúncios sobre festas, bailes e outros eventos musicais da década de 50 em Goa.

Correia explica que tudo começou em 2015 quando lança um livro com várias histórias da cena musical em Angola com o nome de Beto dos Windies, Betu Kalulu – da cena musical em Luanda à consagração no Algarve. Por outro lado a sua curiosidade já estava de certo modo atiçada devido à sua vivência em Macau onde residiu durante 11 anos. Tinha curiosidade de saber como era a presença portuguesa noutras partes do mundo. Quando fazia a pesquisa sobre as festas em Angola onde viveu parte da sua vida, começou também a pesquisar Goa, uma vez que tinha lá estado por curtos períodos de tempo enquanto vivia em Macau. Depois de pedir para pesquisar alguns dos jornais da época, nomeadamente A Vida, o Diário da Noite e O Heraldo (hoje ainda existe como Herald) teve uma surpresa: é pá, os jornais estavam inundados de anúncios de festas! (…) festas dos leques, festas do Carnaval, festas da passagem do ano, festival da espiga (…)

Correia percebeu que era tanta festa que tinha ali pano para mangas. Com base nesses anúncios, crónicas publicadas nesses mesmos jornais e outros jornais em Portugal como A Plateia, construiu a primeira parte do livro que fala sobre a cena musical em Goa até 1961. É aqui também que se refere a Macau pois tanto uma como a outra região são vistas como exóticas dentro da Ásia exatamente por causa da presença portuguesa.

O que lhe chamou mais atenção foram os nomes que muitas vezes apareciam em Português. Bons exemplos disso são Joãozinho e o seu Conjunto Alegre, Azes do Ritmo, Tuna Académica, Afamada orquestra de Benaulim, Conjunto dos Antipáticos entre outros. Temos que nos lembrar que na altura ainda não haviam guitarras elétricas pelo que as orquestras usavam altifalantes. Para além das festas, onde a orquestra estava sempre presente, havia também música nos coretos dos jardins e em casas particulares por ocasião de um aniversário, chegada de familiares de fora ou um batizado por exemplo. Havia sempre uma desculpa para tocar música.

De referir neste livro a parte em que fala do tiatr. Poderíamos pensar que é uma cópia do teatro português, mas na verdade apenas tem origem no vocábulo teatro. Para quem gostar de teatro de revista, vale a pena fazer um estudo comparativo entre o tiatr de Goa e o Teatro de Revista em Portugal. Ambos usam este meio de comunicação como forma de fazer uma crítica social e ambos usam a música como uma forma de entretenimento.

Numa segunda parte do livro, Correia fala da diáspora goesa em Bombaim, Karachi, Moçambique e claro em Portugal. Interessante relembrar a origem goesa de vários artistas portugueses entre eles Mafalda Veiga, Catarina Furtado e Rita Ribeiro.

A terceira parte é dedicada a Goa depois da integração deste território na Índia e que este ano completa 60 anos. São os novos tempos com o aparecimento dos Hippie, Rock and Roll e uma nova geração de músicos que, sem se esquecer as suas origem, foram capazes de reinventar a música goesa. De destacar as PortuGoesas e o belíssimo trabalho de Gonzaga Coutinho. Para quem tiver tempo, pesquisem na net e rapidamente serão transportados para esse lugar considerado exótico, sereno, sensual – como Joaquim Correia diz vezes sem conta, que é Goa.

O sucesso do livro foi imediato e de Goa, imaginem, contataram para criar uma versão em inglês. Não será bem o mesmo pois entretanto as histórias continuaram a surgir. O próximo livro terá o nome de Once Upon a Time in Goa: Music and Dance in a Charming Region and its Diaspora.

Mais histórias para sonhar, música de encantar.

Ficaremos à espera.

 

Folheto de promoção, apresentação feita entre 22 e 28 de Abril de 1956
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Nalini Sousa

Nalini Elvino de Sousa é uma portuguesa de origem goesa que vive em Goa há mais de 25 anos. É incapaz de estar quieta e essa inquietude leva-a assumir vários papéis: professora, realizadora, produtora e etnomusicóloga.
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